terça-feira, 19 de março de 2013

COM MARIA, EM MARIA, POR MARIA, PARA MARIA




As quatro diretivas da sua fórmula

            Montfort apresenta agora, de maneira detalhada, o que significa a sua devoção, onde o fiel deve agir com, em, por e para Maria. Em seu Tratado ele fornece elementos mais fortes para abordar o tema, por isso nos utilizaremos dos dois materiais para formularmos uma doutrina mais completa e mais consistente com o que realmente o santo católico pretende dizer com sua teoria da perfeita devoção a Maria.


1ª. Agir com Maria

            A prática essencial da devoção a Maria consiste, primeiramente, em tê-la como modelo perfeito de tudo aquilo que se deve fazer, fazendo todas as coisas por meio dela (p. 36). Essa teoria Montfort já havia desenvolvido em capítulo anterior, e agora ele aprofunda o tema ensinando a necessidade de uma total aniquilação diante de Deus, algo que jamais pode ser conseguido por meio dos próprios esforços humanos, dependendo, assim, o fiel do patrocínio de Maria, sendo necessário “recorrer à Santíssima Virgem, e unir-se a Ela e às suas intenções, embora desconhecidas” (p. 37). Quando assim o fiel procede, Maria opera nele, dele e para ele como bem lhe parecer, para a maior glória do seu Filho, “de maneira que não haja vida interior e operação espiritual senão sob a dependência dela” (idem).
            No Tratado à Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, as declarações de Montfort são ainda mais sérias e comprometedoras, no que diz respeito à verdade bíblica. Ele afirma (p. 245):

Lembrai-vos, repito-o uma segunda vez, de que Maria é o grande e único molde de Deus próprio para fazer imagens vivas de Deus, com pouca despensa e em pouco tempo; e que uma alma que encontrou este molde, e que nele se perde, fica em breve mudada em Cristo, aí representado ao natural.

            É claro que não existem versículos bíblicos que confirmem o que acabou de ser lido, pois o que se sabe a respeito da imagem de Deus é que ela é o próprio Cristo: “Este é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste” (Colossenses 1:15-17, cf. Colossenses 3:10). Em outras palavras: o Pai e o Filho são a mesma pessoa. E é nesta imagem que fomos escolhidos e predestinados, para sermos conforme a imagem do Filho de Deus (Romanos 8:29). Antes, éramos portadores da imagem terrena e carnal propiciada pela Queda em Adão; agora, porém, devemos “trazer a imagem do celestial” (1 Coríntios 15:49).
             A nossa transformação na imagem de Deus se dá verdadeiramente por Cristo, jamais por Maria ou por qualquer outra criatura. Devemos estar certos que esta não é uma obra meritória, mas fruto do mover gracioso de Deus em nós. Eis o que Paulo escreve aos crentes de Corinto em sua segunda epístola ao retratar a cegueira espiritual do povo judeu que os impedia de enxergar em Cristo o Messias prometido por Deus (3:12-18):

Tendo, pois, tal esperança [cf. 3:1-11], servimo-nos de muita ousadia no falar. E não somos como Moisés, que punha véu sobre a face, para que os filhos de Israel não atentassem na terminação do que desvanecia. Mas os sentidos dele se embotaram. Pois até ao dia de hoje, quando fazem a leitura da antiga aliança, o mesmo véu permanece, não lhes sendo revelado que, em Cristo, é removido. Mas até hoje, quando é lido Moisés, o véu está posto sobre o coração deles. Quando, porém, algum deles se converte ao Senhor, o véu lhes é tirado. Ora, o Senhor é o Espírito; e, onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade. E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito.

            Aquilo que os israelitas estavam impossibilitados de ver, devido à sua falta de fé, a sua cegueira espiritual, nós vemos nitidamente como que num espelho e somos transformados à imagem do Filho de Deus, não por Maria, mas de glória em glória, a glória do Espírito Santo de Deus, que é o próprio Senhor Jesus. A isto pode-se dar o nome de santificação, que envolve transformação à imagem de Cristo (Colossenses 3:10), ocorrendo agora neste presente tempo de nossa conversão ao Senhor (Romanos 12:2) ao contemplarmos a sua glória (João 17:24), tendo como agente o Espírito Santo.
            Sendo assim, o leitor, ou leitora, deverá aceitar a verdade bíblica incontestável e divinamente inspirada que é Cristo quem opera em nós a santidade e é através dele, tendo como agente o Espírito Santo, que nos transformamos em sua própria imagem, como uma recuperação daquela imagem perdida no Éden, quando Adão pecou e destituiu a todos nós da glória de Deus. Não existe, na Bíblia, qualquer alusão à necessidade da veneração à Maria ou algum texto que a coloque como “único” molde de Deus. O molde é Jesus Cristo. Podemos olhar para a figura de Maria na Bíblia e procurar imitar a sua fé e sua obediência constante à vontade de Deus, mas é em Cristo que somos formados e obtemos o crescimento e o amadurecimento espiritual que Deus promove em nós.


2ª. Agir em Maria


            A segunda prática desta devoção diz respeito a fazer tudo em Maria (p. 37, 38), isto é:

habituar-se pouco a pouco a recolher-se dentro de si mesmo, para aí formar uma pequena idéia (sic!) ou imagem espiritual da Santíssima Virgem... Se rezar, será em Maria; se receber Jesus pela sagrada comunhão, colocá-lo-á em Maria para nela ter as suas complacências; se agir, será em Maria; e em toda parte e em tudo produzirá atos de renúncia a di mesma.

            Assim, o fiel católico está cercado de Maria por todos os lados e nada poderá fazer que não seja nela e para ela. Toda a sua fé, todas as suas obras, toda a sua devoção, o seu culto a Deus – se é que realmente existe o desejo de cultuar a Deus – tudo deverá ser feito alicerçado em Maria. Sem ela, nada do que for feito tem sentido algum ou qualquer validade diante de Deus.
Todavia, é em seu Tratado que Montfort apresenta de maneira ainda mais clara a verdadeira natureza de Maria e desta devoção que ele ensina no Segredo de Maria. Ele afirma que a mãe de Jesus é o verdadeiro “paraíso terrestre do novo Adão, de que o antigo paraíso é apenas figura” (p. 245). Compreendendo o que o santo católico está querendo nos ensinar, aquele paraíso descrito por Deus no livro de Gênesis, criado do nada juntamente com todas as outras coisas da terra; aquele lugar de perfeição em que nossos primeiros pais habitavam e onde havia a Árvore da Vida era apenas uma figura do verdadeiro paraíso de Deus, que é Maria, no qual Jesus, por nove meses, habitou.
Tal teoria apresentada por Montfort desemboca consequentemente num dos maiores dogmas do catolicismo romano: o da Imaculada Conceição de Maria. Este dogma de fé foi definido por Pio IX em 8 de dezembro de 1854, pela Bula Ineffabilis Deus. Segundo Montfort, ao retratar o novo paraíso, que é Maria, “Este lugar santíssimo é formado duma terra virgem e imaculada, da qual se formou e nutriu o novo Adão, sem a menor mancha de nódoa, por operação do Espírito Santo que aí habita” (p. 246). Este lugar sagrado e puro é banhado por um rio de humildade que se divide em quatro braços, que são as quatro virtudes cardeais (p. 247). Esta é uma “verdade” pregada pelo próprio Espírito Santo (idem):

O Espírito Santo, pela boca dos Santos Padres, chama também a Santíssima Virgem: 1º a porta oriental, por onde o sumo sacerdote Jesus Cristo entra e vem ao mundo (cf. Ez 44, 2-3); por ela entrou a primeira vez, e por ela virá da segunda; 2º o santuário da Divindade, o reclinatório da Santíssima Trindade, o trono de Deus, a cidade de Deus, o altar de Deus, o templo de Deus, o mundo de Deus.

            O que se pode entender do texto acima é que, sem Maria, nada do que foi feito se fez. Jesus entrou no mundo por meio dela e é por meio dela que virá da segunda vez, isto é, a parousia, quando Cristo voltará e estará para sempre com seus eleitos. É ela o santuário onde Deus habita, não da forma como habita em cada pecador que se converte e recebe o Espírito Santo, mas de uma forma sublime, como se ela de fato contivesse Deus. Em fim, Maria é a própria divindade em si, na qual Deus habita em toda a sua plenitude e glória. Não a terra, não o universo, não a eternidade, mas é Maria o trono, o templo e o mundo de Deus. Onde estaria Deus sem ela?
            Mas como agir em Maria, nós que somos meros pecadores e incapazes de nos aproximar de Cristo por causa dos nossos pecados? É preciso merecer essa graça e poder chegar a este outro paraíso. A forma apresentada por Montfort (p. 248, 249) para que o fiel possa alcançar esse feito é morar no interior de Maria e

aí seguramente esconder-nos e perder-nos sem reserva, a fim de que neste seio virginal: 1 º a alma se alimente do leite de sua graça e de sua misericórdia maternal; 2º aí fique livre de suas perturbações, de seus temores e escrúpulos; 3º aí esteja em segurança, ao abrigo de todos os seus inimigos, o demônio, o mundo e o pecado, que aí não tem jamais entrada; e por isso diz que os que operam nela não pecarão; “Qui operantur in me, non peccabunt” (Ecli 24, 30), isto é, os que, em espírito, habitam a Santíssima Virgem, não cometerão pecado grave; 4º para que a alma fique formada em Jesus Cristo e Jesus Cristo nela; porque o seu seio, como dizem os Santos Padres, é a sala dos sacramentos divinos, onde Jesus Cristo e todos os eleitos se formaram: “Homo et homo natus est in ea” (sl 86, 5).

            Devemos lembrar que, na teologia católica, os sacramentos, assim como o pertencer à igreja católica romana, são sinais visíveis de salvação. Eles conferem graça à pessoa, a começar pelo batismo, e a tornam filhas de Deus e pertencentes à igreja, corpo de Cristo. Neste sentido, então, já que Maria é a “sala dos sacramentos divinos”, nele se encontra a nossa salvação. Isto nada mais é do que Ligório repete do começo ao fim do seu livro, “Glórias de Maria”. Por exemplo, na página 141:

De três modos, explica o Padre Suárez, cooperou a divina Mãe para a nossa salvação. Primeiro, merecendo com merecimento de côngruo a Encarnação do Verbo. Segundo, rogando muito a Deus por nós, enquanto esteve no mundo. terceiro, sacrificando com boa vontade a Deus a vida do seu Filho para nossa salvação. Tendo, pois, Maria cooperado para a redenção com tanto amor pelos homens e tanto zelo pela glória divina, com razão determinou o Senhor que todos nos salvemos por intermédio de sua intercessão.

            Faz-se necessário um breve estudo, seguido da refutação do dogma da Imaculada Conceição de Maria para que possamos entender melhor a incoerência da teologia de Montfort. A doutrina da Imaculada Conceição de Maria é por demais fabulosa e difícil de ser estudada, tendo em vista a complexidade de explicações e “provas” apresentadas pelos seus promulgadores. Assim como a Assunção e Coroação, esta doutrina só veio se desenvolver no decorrer dos séculos, através da Tradição. As primeiras ideias acerca da Imaculada Conceição de Maria aparecem entre os cônegos de Lião no ano de 1125, século XII, sendo definida como dogma somente no século XIX. Um dos trechos bíblicos utilizados como base para a doutrina da Imaculada Conceição é o de Cantares 4:7: “Tu és toda formosa, querida minha, em ti não há defeito”.
            Este dogma de fé católico romano foi definido, como vimos, por Pio IX em 8 de dezembro de 1854, pela Bula Ineffabilis Deus. Mas já em 1166 o imperador Manuel Commeno declarou a festa da Imaculada Conceição (celebrada a partir do século VIII em vários conventos do Oriente) feriado nacional. Pio IX atestou que Maria foi imune do pecado original, em previsão dos méritos da redenção operada em Cristo. Isto é, além de Maria ser concebida sem pecado antes mesmo de Jesus Cristo o ser, alcançou a salvação antes ainda da vinda de Cristo ao mundo e de sua Paixão. O principal testemunho desta doutrina parte principalmente de S. Afonso de Ligório (p. 237), declarado pelo papa Pio IX doutor da igreja:

Para aplacar um juiz, não se lhe pode mandar seu inimigo, observa Gregório Magno. Este, em vez de o aplacar, mais o irritaria. Entretanto Maria tinha de ser medianeira de paz entre Deus e os homens. Logo, absolutamente não podia aparecer como pecadora e inimiga de Deus, mas só como sua amiga toda imaculada. Mais um motivo reclamou que Deus preservasse Maria da culpa original.

Aplica-se a isto o fato de que Jesus não haveria de nascer de uma criatura manchada pelo pecado original, para que o inimigo (o diabo) não tivesse do que o acusar. Entendemos, então, que, nascendo de uma mulher pecadora, Jesus haveria de ser contaminado também pela maldição adâmica. Para que isto não sucedesse, Maria teria de ser isenta de toda mancha do pecado original. Foi Maria também poupada do pecado original para que fosse a “esposa” do Espírito Santo: “Virgem bendita, és formosíssima em todo sentido; em ti não há mancha alguma de qualquer pecado, leve ou grave ou original. Idêntico é o pensamento do Espírito Santo, chamando sua esposa de ‘jardim fechado e fonte selada’ (Ct 4, 12)” (Ligório, p. 248). O mesmo pensamento é expresso no Concílio Vaticano II (LG 56):

Quis, porém, o Pai das misericórdias que a encarnação fosse precedida pela aceitação daquela que era predestinada a ser a Mãe de seu Filho, para que assim como a mulher contribuiu para a morte, a mulher também contribuísse para a vida. O que de modo excelentíssimo vale da Mãe de Jesus, a qual deu ao mundo a própria Vida que tudo renova e foi por Deus enriquecida com dons dignos para tamanha função. Daí não admira que nos Santos Padres prevalecesse o costume de chamar a Mãe de Deus de toda santa, imune a toda mancha de pecado, como que plasmada pelo Espírito Santo e formada nova criatura.

            Em concordância com isso, Murad (2009, p. 124) afirma que “Maria é pré-redimida pelo Verbo de Deus. Ela recebe a graça salvadora numa intensidade maior do que nós, o que lhe dá força para integrar tendências e pulsões”. Essa Imaculada Conceição, segundo Roschini (1960, p. 121) é singular, isto é um privilégio só de Maria; em previsão dos méritos de Cristo, sendo Maria redimida de forma preservativa (impedindo a sua queda); e no primeiro instante de sua existência, isto é, no momento em que sua alma foi criada, impedindo que o pecado a atingisse. Assim, segundo o mesmo autor, “Maria não estêve (sic!) nunca, portanto, nem mesmo por um instante, sob a lei do pecado, sob o domínio de Satanás”.
Ainda outro texto utilizado para reafirmar esta doutrina é o de Lucas 1:30: “Mas o anjo lhe disse: Maria, não temas; porque achaste graça diante de Deus”. Em muitas traduções católicas romanas o versículo 28 aparece com a expressão “cheia de graça” ao invés de “muito favorecida”, que indica que Deus estava com ela. O objetivo desta troca de expressões é, muito provavelmente, o de enaltecer Maria e diferenciá-la das demais pessoas, ditas comuns, e dos santos e anjos. É o que atesta Ligório (p. 260):

Ora, em vista da escolha de Maria para Mãe de Deus, convinha certamente que o Senhor, desde o primeiro instante, a adornasse com uma graça imensa, superior em grau à de todos os outros homens e anjos. Pois tal graça tinha de corresponder à imensa e altíssima dignidade, à qual o Senhor a elevara.

Esta graça não poderia estar contida em uma alma pecadora, mas somente em uma alma “imaculada”, separada das demais criaturas. Tendo em vista uma Maria “cheia de graça”, o que dizer, então, de Noé quando a Palavra de Deus afirma que “Noé achou graça diante de Deus”? (Gênesis 6:8). O comentário de Dr. Russel Shedd, na Bíblia Vida Nova, traz os seguintes esclarecimentos acerca deste trecho:

Noé ilustra quais são os elementos essenciais na vida do verdadeiro crente: 1) Sua posição (v 8), salvo, sem o merecer, pelo favor de Deus; 2) Sua atitude (v 9), ele era homem justo; 3) Seu caráter (v 9), era perfeito (significando retidão genuína); 4) Seu testemunho (v 9), “em sua geração”, ou entre os contemporâneos. Era um pregador da justiça (2 Pe 2:5); 5) Sua comunhão com Deus (v 9), “andou com Deus”; 6) Sua conduta (v 22), sempre em consonância com a vontade revelada de Deus.

            O que vemos em Noé é a figura de um homem justo que agradava a Deus em seus caminhos e condutas; dava testemunho aos homens da justiça de Deus, ao ponto de ser separado para construir e Arca e nela embarcar com os seus familiares. Porém, nem por isso Noé achou-se imbuído de tão grande graça como Maria na doutrina romanista. E se Maria achava tão bela graça diante de Deus em comparação com a graça achada em Noé, dela certamente decaiu ao ser proclamada “rainha do céu”, “senhora do mundo”. Porque a graça que Deus nos deu é para exaltá-lo, e não a nós. É para que Ele reine em nós e, não, nós nele.
            O que sabemos acertadamente, é que todo homem carrega em si aquilo que alguns teólogos costumam denominar de “maldição adâmica”, que popularmente conhecemos por “pecado original”, e isto certamente inclui Noé, o apóstolo Paulo, Maria e toda a raça humana. Em Romanos 3:23 temos o apoio escriturístico para esta verdade incontestável: “pois todos pecaram e carecem da graça de Deus”. Todo o quinto capítulo, também do livro de Romanos, tratará deste assunto: o pecado original em Adão e a justificação pela fé em Cristo. Já no capítulo quatro do livro de Gênesis o pecado é citado pela primeira vez (v. 7). Aquele que diz não ter pecado a si mesmo se engana (1 João 1:8). Desta forma, estarão os doutores católicos enganados ao declararem Maria sem pecado, pois ela mesma jamais fez tal declaração.
            Do fato de o homem haver quebrado a sua comunhão perfeita com Deus se distanciando dele, provém a expiação pelo pecado na Antiga Aliança (cf. Êxodo 29:36 e Deuteronômio 32:43), e mais perfeita e definitivamente através de Cristo, na cruz do Calvário (Colossenses 1:20 e 2:14). Da compreensão do pecado original depende a compreensão do sacrifício de Cristo e de toda a doutrina do Novo Testamento. É seguro dogma de fé que Cristo morreu para nos reconciliar com Deus (cf. Romanos 5:10; 1 Coríntios 15:3,22; 2 Coríntios 5:18; Gálatas 1:4; Colossenses 1:20; 1 Pedro 3:18). Pelo fato de sermos pecadores é que em nós abundou a graça salvadora e vivificadora de Deus em seu Filho (Romanos 5:20).
            Dentro desta compreensão bíblica, a doutrina da Imaculada Conceição de Maria tende a negar inúmeras verdades. As Escrituras afirmam que o Messias haveria de ser puro, sem mancha do pecado original (1 Pedro 1:19; 2:22; 3:18; Hebreus 4:15; 1 João 3:5). Para tanto, a sua concepção jamais poderia acontecer através do método natural de concepção, entre seres pecadores. Ele seria o próprio Verbo encarnado (João 1:14), o Filho do Deus Vivo (Mateus 16:16), livre de toda contaminação pecaminosa, separado de todo o mundo. Esta declaração é ponto pacífico nas Escrituras, a não ser por algumas seitas que insistem em negar a divindade de Cristo (diversas seitas da Idade Média, os Testemunhas de Jeová, o Islamismo, etc.).
            A Bíblia, contudo, não deixa claro ou sequer fornece base para tal, que a virgem que receberia a semente do Espírito Santo deveria ser imune do pecado original. A impecabilidade de Cristo é incontestável, mas a de Maria é certamente impossível. O que sabemos, é que a própria Maria em seu Magnificat declara-se carente de um salvador: “A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador” (Lucas 1: 46). E quem necessita de um salvador senão o homem perdido?
            Para confirmar a doutrina da Imaculada Conceição, teríamos que negar toda a Palavra de Deus. Contudo, Maria cria na salvação que ao mundo estava sendo oferecida através de Jesus Cristo. Ela haveria de compreender mais tarde todo o plano da salvação, compreender o significado da morte de seu filho amado e esperar pela sua ressurreição. Maria certamente cria que Cristo morreu pelos nossos pecados (1 Coríntios 15:3), o justo pelos injustos (1 Pedro 3:18). Sabia, também, que somente Ele poderia salvá-la e a toda humanidade (Atos 16:31; Romanos 10:9; Efésios 2:8,9; Tito 3:5). Não seria pelos seus merecimentos que Maria seria salva ou por possuir uma santidade elevada acima dos homens e dos anjos, pois “o justo viverá pela fé” (cf. Gálatas 3:11 e Hebreus 10:38). Nossas justificativas perante Deus são como “trapos de imundície” (Isaías 64:6).


3ª. Agir por Maria


            Neste terceiro ponto, no livro “O Segredo de Maria”, Montfort apenas diz: “É necessário ir sempre a Nosso Senhor só por Maria, pela sua intercessão e pelo seu crédito junto dele, de sorte que nunca o encontraremos só quando oramos” (p. 38). Porém, antes de nos atermos ao estudo desse trecho, acima de tudo sobre a declaração de que jamais encontraremos Jesus apenas orando, precisamos ver o que ele explica no seu Tratado a respeito do mesmo tema, isto é, em tudo agir por Maria. Nele, o santo católico afirma (p. 241, 242):

É preciso fazer todas as ações por Maria, quer dizer, em todas as coisas obedecer à Santíssima Virgem, e em tudo conduzir-se por seu espírito, que é o santo espírito de Deus. São filhos de Deus os que se conduzem pelo espírito de Deus... E os que pautam sua conduta pelo espírito de Maria são filhos de Maria e, por conseguinte, filhos de Deus... Disse que o espírito de Maria é o espírito de Deus, porque ela jamais se conduz por seu próprio espírito, e sempre pelo espírito de Deus, e este de tal modo a dominou que acabou tornando-se seu próprio espírito.

            Ele, então, ensina que esta prática devocional envolve renunciar a seu próprio espírito e vontade, entregar-se ao espírito de Maria para ser movido e conduzido conforme ela quiser, e desenvolver sempre este ato de oferecimento e união para chegar mais cedo à união com Jesus pelo espírito de Maria, que é o espírito do próprio Cristo (p. 243, 244). Sugiro que se leia novamente o trecho acima da obra de Montfort para que não restem dúvidas que o que ele está querendo nos insinuar é uma ligação direta e inseparável de Maria com o “espírito de Deus” que, como sabemos, é o Espírito Santo. Isto é, o Espírito Santo e o espírito de Maria, por causa de sua união com Cristo, é o mesmo Espírito Santo.
            Lendo e entendendo a doutrina de Montfort, não nos admira ele chamar Maria de “divina”, porque realmente ela não somente é a quarta pessoa da Trindade, como é tratada como deusa, não somente por Montfort, mas pela maioria dos teólogos católicos. Porém, o que lemos acima não é nada para se comparar com o que Ligório escreve em seu livro, Glórias de Maria, citando o ensino de São Tomás (p. 292, 293):

Quanto mais uma pessoa se avizinha ao seu princípio, tanto mais recebe da sua perfeição. Ora, sendo Maria a criatura mais vizinha a Deus, do mesmo Deus ela participou mais graça, perfeição e grandeza. Que todas as outras criaturas... ser Mãe de Deus é a dignidade imediata depois da dignidade de ser Deus. Por isso, diz que Maria não pode ser mais unida a Deus, do que foi, senão fazendo-se Deus [...] A virgem devia ser Mãe de Deus. Precisou, portanto, na linguagem de S. Bernardino, ser exaltada a certa igualdade com as Pessoas Divinas, por meio de uma quase infinidade de graças... Aqui trema e emudeça toda criatura, ousando apenas contemplar a imensidade de tão sublime dignidade! Deus habita no seio da Virgem, com ela mantém a identidade de uma natureza.

            O que dizer a vista dessas coisas? Que palavras o crente fiel em Cristo e conhecedor da Palavra de Deus pode utilizar para expressar a sua indignação diante de tal doutrina? Note-se que tanto Montfort como Ligório não se utilizam de textos das Sagradas Escrituras para confirmar seus ensinos, mas da palavra dos santos e doutores da igreja romana, que por sua vez também não possuem base bíblica para suas asseverações. Estamos diante de uma doutrina estranha à Bíblia, que não pode ser encontrada em parte alguma, do Gênesis ao Apocalipse. Nem Moisés, nem os profetas, nem Jesus, nem os apóstolos, nem Paulo em suas epístolas, nem qualquer outro escritor dos livros da Bíblia fizeram alusão ao que acabamos de ler.
            Assim diz o Senhor por intermédio do profeta Isaías: “Eu sou o Senhor, este é o meu nome; a minha glória, pois, não a darei a outrem, nem a minha honra, às imagens de escultura” (42:8). Muito mais que às imagens de escultura de Maria, o catolicismo romano dá a glória que é devida somente a Deus à própria pessoa de Maria. Toda a mariolatria e a invocação dos santos estão excluídas através da compreensão da verdade de Deus expressa neste texto do profeta Isaías. O culto ao ego e ao dinheiro da Teologia da Prosperidade, também não encontra lugar na adoração dos filhos de Deus. Deus é o grande Eu Sou e nenhuma criatura finita, como Maria ou qualquer um de nós, mantém identidade divina com Ele. A nossa identidade com Deus está em Cristo Jesus, o que não nos torna deuses, mas humanos pecadores santificados pelo Espírito Santo.
            Esta terceira prática prova incontestavelmente aquilo que o cristianismo Reformado, Protestante, vem dizendo há vários séculos a respeito da devoção católico-romana à Maria: é de fato uma idolatria, ou “mariolatria”. Além disso, contrariando completamente todas as palavras ditas por Jesus a respeito do tema, Montfort afirma que nunca encontraremos Jesus só quando oramos. Não somente quando oramos, mas quando cremos, nos aproximamos livremente de Jesus, que nos recebe como filhos amados do Pai. O apóstolo João escreveu: “Estas coisas vos escrevi, a fim de saberdes que tendes a vida eterna, a vós outros que credes em o nome do Filho de Deus. E esta é a confiança que temos para com ele: que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, ele nos ouve” (1 João 5:13,14). O Senhor Jesus nos ouve, nos atende, nos recebe, nos abraça, nos afaga. Ele está conosco, presente, vivo, atuante.
            O próprio Senhor Jesus nos exorta a ir até Ele: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para vossa alma. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve” (Mateus 11:28-30). E, em João 6:35-40, disse também:

Eu sou o pão da vida; o que vem a mim jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede. Porém eu já vos disse que, embora me tenhais visto, não credes. Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora. Porque eu desci do céu, não para fazer a minha própria vontade, e sim a vontade daquele que me enviou. E a vontade de quem me enviou é esta: que nenhum eu perca de todos os que me deu; pelo contrário, eu o ressuscitarei no último dia. De fato, a vontade de meu Pai é que todo homem que vir o filho e nele crer tenha a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia.

            Ir até Jesus é uma liberdade e uma necessidade da alma humana. É somente encontrando o Salvador que poderemos ser salvos. Ele não coloca barreiras nem nos impede de chegar até Ele, contanto que seja pela fé na sua obra redentora. Estando em Cristo, estamos certos de poder contar com sua intercessão e com sua resposta às nossas orações. Diversos textos bíblicos nos garantem que podemos, sim, nos aproximar de Jesus em oração e que devemos fazer tudo em seu Nome. Por exemplo: Mateus 18:20; João 14:13; 15:16; 16:23; Atos 2:21; 2 Coríntios 5:20; Colossenses 3:17. Não existem razões bíblicas ou mesmo racionais para acreditar que o remido não pode se aproximar de Jesus e que deve fazê-lo somente por Maria. Como já vimos, em Cristo temos livre acesso ao Pai; logo, também temos livre acesso a Ele, pela fé, por meio da graça, jamais de forma meritória.


4ª. Agir para Maria

            A quarta e última forma desta devoção é fazer todas as coisas para Maria, sendo escravo desta “augusta Princesa” (p. 38), como um criado, um servo, um escravo (Tratado, p. 249). Mais uma vez Montfort repete que absolutamente nada na vida cristã deve ser feito sem a presença de Maria, sua intercessão, seu patrocínio. Ela deve ocupar o centro das ações de seus fiéis súditos, de modo que cada palavra, cada reza, cada sacrifício, cada gesto de caridade para com o próximo, cada sufrágio pelas almas que penam no purgatório, cada esmola, cada peregrinação tenham a sua inteira participação. Tudo pertence a ela e a ela deve ser creditado. E esse é um meio, segundo o pensamento do santo católico, de chegarmos até Jesus e agradarmos a Deus, que é, apenas em tese, o fim último desta devoção.
            Contra esta prática e todas as demais, pesa a verdade incontestável da Palavra de Deus. De duas formas: não dando nenhum suporte a tal veneração, e condenando-a veementemente. A Bíblia nos ensina que toda a vida cristã deve estar alicerçada sobre um único fundamento, que é Cristo, a pedra angular da igreja (Atos 4:11; Efésios 2:20). Nele encontra-se toda a nossa suficiência. Ele é o motivo da nossa adoração, do nosso serviço, dos nossos dons, da nossa santidade. Eis algumas verdades que nos dão a certeza de que Cristo somente nos basta:

·         É por meio de Cristo que o poder de Deus se aperfeiçoa nas nossas fraquezas (2 Coríntios 12:7-10). Se houvesse a necessidade da mediação de Maria para nos aperfeiçoarmos ou alcançarmos de Deus seus dons e suas graças, certamente a Bíblia nos informaria ou algum dos apóstolos, como Paulo, teriam esta prática na sua vida. Muito embora o fato de Jesus ter colocado Maria sob os cuidados do apóstolo João e isso ter sido entendido pelo catolicismo romano como a maternidade de Maria sobre os crentes, nenhum personagem bíblico jamais a chamou de mãe ou contou com suas orações, conselhos, mediação e intercessão.
·         Fomos criados em Cristo Jesus para toda a boa obra (Efésios 2:10). É Ele quem nos consola e nos confirma em toda boa obra e boa palavra (2 Tessalonicenses 2:16,17). Não é a escravidão a Maria que nos torna perfeitos obreiros do Senhor, se assim fosse, Estêvão, antes de ser morto, teria dado graças a Maria por tê-lo feito merecedor de sofrer pelo Evangelho de Cristo, da mesma forma os outros apóstolos. Da cadeia, Paulo e Silas não clamaram por Maria, nem o apóstolo João, preso na ilha de Patmos, de onde escreveu o livro do Apocalipse, fez qualquer menção à necessidade da intercessão da mãe de Jesus.
·         Temos livre acesso a Deus através de Cristo (Romanos 5:1,2; João 15:16) e livre acesso a Cristo através da conversão e da oração, quando clamamos pelo seu poderoso Nome (João 14:13; Atos 4:12; Romanos 10:13). Em parte alguma da Bíblia existe a intermediação de Maria entre o crente e Cristo, mas somente entre o crente e Deus: Jesus Cristo. É estranho que, diante de tanta certeza dos santos e doutores católicos da mediação de Maria e da sua interseção, nenhum dos apóstolos tenha feito uso deste artifício nem deixado absolutamente nada escrito sobre ele, nem mesmo um versículo.
·         A oração do crente tem muito poder junto a Deus (Tiago 5:16). A eficácia da oração do crente está no poder de Deus que o justifica e o torna aceito diante de Deus. A Bíblia, além de garantir que o crente será atendido segundo a vontade de Deus, não coloca barreira alguma que o impeça de chegar até Ele, a não ser a sua falta de fé ou seu desejo egoísta. Todas as barreiras que havia entre Deus e os homens foram quebradas quando Cristo derramou seu sangue na cruz, ressuscitou e subiu glorioso aos céus.
·         Tudo o que nós fizermos deve ser direcionado exclusivamente à glória de Deus, agindo com, em, por e para Jesus: “E tudo o que fizerdes, seja em palavra, seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por  ele graças a Deus Pai” (Colossenses 3:17). O que somos, temos e fazemos deve ser apresentado diante do trono de Deus por meio de Jesus Cristo. Por Ele damos graças a Deus, sem a necessidade de Maria ou qualquer outro santo que já tenha morrido ou ainda viva entre nós.

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4 comentários:

  1. Você não entende se não estiver na graça de Deus! Hoje, dia 25.03.13, faço 10 anos de consagrada a Jesus por meio da Virgem Maria... FELIZ DA VIDA! Você explica bem... bem da forma protestante e sem lógica!

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  2. AMADO MIZAEL VC É MUITO INTELIGENTE QUE O ESPIRITO SANTO LHE CONDUZA A SABEDORIA PARA QUE VOCE ALCANCE O CÉU ONDE MARIA LHE AGUARDA COMO FILHO AMADO

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  3. Uma senhora analfabeta foi ao médico e depois de realizar alguns exames o médico falou:

    - A senhora é crente, não é?
    - Sou, sim.
    - Eu gosto muito de crente, só tem um problema, eles falam muito de Jesus, mas falam pouco de Maria.
    (Silêncio)
    - Doutor, posso te fazer uma pergunta?
    - Sim.
    - Se, quando eu chegasse aqui, sua secretária me dissesse que você não estava, mas sua mãe estava sim, você acha que eu ia querer ser atendida por ela?
    - Claro que não, quem se formou em medicina não foi ela, fui eu!
    - Pois é, doutor, quem morreu na cruz por mim foi ELE e não ela!

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