quinta-feira, 11 de agosto de 2022

LONGE DA IGREJA, MAS PERTO DE DEUS?



Longe da Igreja, mas perto de Deus?

AUTOR: Mizael de Souza Xavier

Cresce no mundo o número de adeptos de um erro teológico que se denomina “desigrejados”, onde indivíduos que rejeitam a igreja institucionalizada, seus estatutos, sua forma de governo e seu estilo de culto buscam reuniões alternativas em que nada disso esteja presente. Na prática, mudam apenas os locais de reunião, criando outro governo e suas próprias crenças e regras. Cresce, também, os ministérios on-line e as igrejas virtuais, com cultos, pregações e ensino que acontecem somente à distância, inclusive a arrecadação de dízimos e ofertas. Todas essas coisas caminham na contramão do ensino de Jesus e dos apóstolos, bem como do estilo de vida e da prática de fé da Igreja neotestamentária, que perdurou pelos séculos e que ainda está presente na grande maioria das igrejas cristãs. O povo de Deus jamais deixou de se congregar, embora sempre tenham ocorrido variações no formato e no estilo de reunião da assembleia dos crentes e também erros. Para evitar tais erros, em vez de repará-los, investem-se em outros tipos de erros travestidos de soluções. E nada disso é novidade.

Outra questão importante quando se fala em deixar de ir à igreja (congregação, comunidade eclesial, templo, denominação) é a velha máxima de muitos crentes que se encontram desviados e que pode ser resumida na seguinte declaração: “Estou afastado da igreja, não de Deus”. Embora o crente genuíno jamais deixe de ser membro do Corpo místico de Cristo, que é a Igreja invisível, ao deixar de congregar com outros irmãos, ele desobedece à Cabeça desse corpo, que estipulou que todos vivessem em comunhão e compartilhassem a fé, o amor, os dons e o serviço para a mútua edificação (Sl 133:1-3; 1 Co 1:10; 12:4-27; 14:12; Rm 12:4-8; Ef 4:11-13). O texto de Hebreus 10:19-27 sintetiza bem isso. Por que não devemos deixar de congregar? Porque o acesso gracioso à presença de Deus por meio de Cristo santifica a nossa vida e confirma a nossa fé (vs. 19-23). E isso não traz frutos apenas para a nossa relação com Deus, mas também com os nossos irmãos em Cristo, dentro e fora da igreja local. Na igreja, somos santos que manifestam sua santidade para a edificação uns dos outros. Boa parte dessa santidade (santificação progressiva) só pode ser desenvolvida no contato entre crentes.

Os salvos devem considerar-se uns aos outros, estimulado-se ao amor e às boas obras (v. 24). Isto não se dá quando cada um está isolado no seu próprio mundo, mas quando todos se reúnem com esse propósito. Por isso, o autor escreve: “não deixemos de congregar-nos” (v. 25; gr. episynagoge, o ato de se ajuntar ou reunir; cf. 1 Ts 4:17; 2 Ts 2:1). Estando congregados, podemos admoestar uns aos outros a respeito da possibilidade do pecado e da necessidade de vencê-lo (vs. 26,27). Aquele que não permanece na igreja porque está em pecado, nega ser admoestado, corrigido e disciplinado. Ele acredita que, sozinho, poderá consertar-se, negando a necessidade dos irmãos e de um líder espiritual no processo. Deus estabeleceu a Igreja como um organismo vivo e interdependente. Se alguém diz que está em comunhão com Deus mesmo fora da igreja local, essa comunhão, provavelmente, não envolve estudo e obediência da Palavra, porque lhe faltam a prática de muitos mandamentos e a observação de diversas doutrinas que só podem ser postos em prática em comunhão com a igreja local, que se reúne com esse propósito, além da adoração a Deus.

Como estar em Deus sem estar ao lado dos irmãos e dos pastores que Ele próprio instituiu para zelar pelo seu rebanho (1 Tm 5:17,18; 2 Tm 2:24-26; 4:2; At 20:28; Fp 2:4; 1 Pe 5:2-4)? Como não estar afastado de Deus enquanto se está afastado de tudo aquilo que a sua Palavra ensina? O maior erro desse tipo de argumento é considerar Deus sem levar em conta a sua Palavra, de modo a se ver livre da obrigação de obedecê-la. Essa “comunhão desviada” com Deus, geralmente se restringe a continuar a acreditar na sua existência e confiar na sua providência e na sua resposta às orações: “Deus não me abandonou, eu converso sempre com Ele e Ele sempre atende as minhas orações”. Ou seja: pode-se continuar a pecar e a estar longe da igreja e da comunhão com os irmãos, porque Deus sempre estará presente, porque Ele é fiel, mesmo que sejamos infiéis (2 Tm 2:13) e nada pode nos separar do seu amor (Rm 8:35-39). Essa forma de pensar perigosa deve acordar essas mentes para Tiago 2:19: “Crês, tu, que Deus é um só? Fazes bem. Até os demônios creem e tremem”. Eles creem e tremem, mas não se submetem gentilmente a Deus. O seu único compromisso com a Palavra de Deus é afastar dela os crentes.

Não podemos nos enganar, como os ímpios que, às vezes, declaram-se crentes e até mantêm uma espécie de piedade aparentemente cristã, mas que não foram regenerados, selados com o Espírito Santo e tornados membros do Corpo de Cristo. Para eles, a Bíblia não é Palavra autoritativa de Deus nem a Igreja uma necessidade. Eles dão à sua fé o formato que desejarem. Entretanto, aquele que está em Cristo é nova criatura e não vive mais em seu próprio reino, mas está ligado a Jesus e à sua Igreja, da qual é membro e da qual depende para viver uma espiritualidade sadia e genuinamente bíblica. Desde o Pentecoste, o povo de Deus é estimulado a viver em comunhão e a se reunir como comunidade e assembleia (At 2:37-47; 4:32-37). No Novo Testamento existem exortações e mandamentos que só podem ser cumpridos em um contexto de reunião periódica, de congregação. Todos envolvem expressões como:

  • uns dos outros” (1 Co 13:25; Gl 5:2; Ef 4:25; Tg 4:11);

  • uns aos outros” (1 Co 16:20; 2 Co 13:12; Gl 5:13-16; 1 Ts 4:9,18; 5:11; Hb 3:13; 10:24; 1 Pe 1:22; 5:5,14; 1 Jo 3:11,23; 4:7-12; Rm 12:10; 13:8; 14:13; 15:7,14; 16:16; Ef 4:2; 5:21; Cl 3:9-16; Tg 5:16; 2 Jo 1:5);

  • uns pelos outros” (1 Co 11:33; Tg 5:16);

  • uns para com os outros" (1 Ts 3:12; 5:15; 1 Pe 4:8; Ef 4:32).

Esses exemplos são apenas para citar os textos que envolvem as expressões entre aspas, sem contar a variedade de outros mandamentos que, assim como esses, só podem ser praticados por meio da comunhão entre os irmãos na igreja local e fora dela, nos lares ou onde quer que haja o contato entre os crentes. Ainda que alguém decida viver sem se congregar mas, ao mesmo tempo, buscar cumprir esses mandamentos, sendo presente e atuante na vida das pessoas, permanece o fato de que rejeita a comunhão e a submissão a uma autoridade pastoral constituída por Deus. Portanto, não há escapatória quando se pretende viver para Deus, porque isso envolve obedecer a sua Palavra, e ela ordena: “não deixemos de congregar-nos”.

O caminho de quem saiu da Igreja sempre deverá ser o regresso, ainda que não para a mesma denominação. Mas seu pecado precisa ser tratado e abandonado. Tantos crentes até se veem obrigados a deixarem de congregar por serem maltratados em algumas igrejas, mas acabam cometendo o pecado de abandonar de vez a comunhão com os irmãos e carregam amargura e orgulho durante muito tempo. O pecado dos outros não justifica o nosso nem alivia o seu peso. E o fato de estarmos debaixo da graça de Deus e sentirmos a sua presença mesmo quando deixamos de ir à igreja, não justifica nossos erros nem afasta de nós a necessidade de arrependimento. Se insistimos que podemos viver em pecado longe de Deus e dos irmãos e ainda assim afirmar que não abandonamos a Deus, faz-se um bom momento para repensarmos a nossa salvação. Aquele que é de Deus e nele permanece, não vive na prática do pecado, mas (1 Jo 3:6). Não viver em comunhão com os irmãos quando isto é um mandamento, configura-se pecado.

Concluamos com alguns conselhos preciosos para aqueles que sustentam com convicção a teoria: “Estou afastado da igreja, não de Deus”:

1. Procure ler e estudar a Palavra de Deus para além dos textos que trazem conforto ao seu coração, atentando para aqueles que o confrontam com seus pecados, que o chamam à santidade e que revelam que, como membro do Corpo de Cristo, você precisa dos outros membros, seus irmãos em Cristo.

2. Em vez de se sentir bem com seus pecados ou mesmo que se sinta culpado, mas incapaz de se arrepender, siga a ordem do Senhor à igreja de Éfeso: procure lembrar de onde caiu e se arrependa; volte ao primeiro amor e às primeiras obras (Ap 2:1-7). Não se sente capaz? Peça a Deus que te dê graça, vontade e força. Esta é uma obra do Espírito Santo. Clame a Ele!

3. Peça e libere perdão. Reconstrua os relacionamentos desfeitos. Afaste de você toda ira, orgulho, amargura e qualquer outro tipo de pecado (Ef 4:30-32; Cl 3:18,19; Tg 3:14,15). Resolva os problemas antes que eles piorem. Entenda que, por onde você for, eles te acompanharão, trarão peso à sua alma, não deixarão quieta a sua mente nem darão descanso ao seu coração. Tenha a mesma atitude que Davi, no Salmo 32:1-5.

4. Se o seu problema não é estar desviado e em pecado, mas ter comprado a ideia disseminada pelos “desigrejados”, reveja tais conceitos sobre Igreja à luz da Palavra de Deus. Estude a história do Cristianismo e da Igreja cristã. Inspire-se nos bons exemplos de grandes homens de Deus, suas denominações evangélicas, sua contribuição para o Reino de Deus e para a sociedade, seu papel social e na evangelização dos povos.

5. Perceba o risco do abandono da sã doutrina para tentar corrigir os erros de algumas denominações que, nem sempre, são igrejas de verdade. Essa é apenas uma porta de entrada para grandes heresias, como a “igreja inclusiva”, que abraça a ideologia de gênero e já começa a espalhar seus tentáculos malignos sobre aqueles movimentos que não guardam a verdadeira fé ortodoxa. Perceba que, para fugir de estatutos e regimentos internos, os desigrejados e outros movimentos heréticos criam seu próprio conjunto de crenças e determinam o que seus adeptos devem ou não crer. Quem os regula?

6. Ninguém pode ser cristão sozinho, porque ser cristão é ser membro do Corpo de Cristo, que é a Igreja. Se você não está nem quer estar em comunhão com outros irmãos em Cristo, se não sente essa necessidade nem reconhece o seu valor, pode ser que a sua fé seja falsa de um ponto de vista que realmente importa: o da Palavra de Deus. Ela pode ser a “sua” fé, o seu modo de entender Deus e viver o que acha ser verdade, mas que contradiz as doutrinas mais elementares que Deus inspirou homens para escrever e deixou registrado nas páginas da Bíblia Sagrada. Portanto, reveja seus conceitos e opte pela verdade.

7. Por fim, não se acomode ao mundo virtual nem permita que ele roube a sua comunhão presencial com seus irmãos em Cristo. A natureza da Igreja não é virtual, jamais foi e jamais será. Tudo acontece presencialmente. Faça uso das programações on-line somente em último caso, quando ir à igreja não for possível devido a alguma situação extraordinária. Fora isso, priorize estar presente para cultuar a Deus em comunidade e servir à comunidade com seus dons e talentos. Estando em comunhão com seus irmãos na igreja local, pregações e estudos bíblicos virtuais sempre serão uma benção.


SOBRE O AUTOR:


Mizael Xavier é membro da Igreja Batista em Parnamirim, no Rio Grande do Norte, estudante do curso de teologia no Seminário Teológico Batista Potiguar e formado em Gestão de Recursos Humanos. Serve a Deus como pregador, evangelista e professor. Já publicou diversos livros digitais pela Amazon, entre eles: “Manual do obreiro aprovado”, “Curso de formação de evangelistas”, “Batalha Espiritual’: uma luta em defesa da verdade”, “Assédio moral no trabalho”, “Ninguém morre de amor”, “O poder da oração” e “Missão Integral”.

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