O dízimo e o
Novo Testamento
“Porque o fim da lei é
Cristo, para justiça de todo aquele que crê”
(Romanos 10:4)
O dízimo antes da lei
Os
defensores da obrigatoriedade do dízimo para o cristão esbarram na realidade de
que ele faz parte de uma lei que já foi cumprida por Cristo e por isso
tornou-se obsoleta. Se não há mais necessidade de cumprirmos a lei porque
Cristo já a cumpriu por nós, dizimar já perdeu todo o seu sentido. Então, como
não vivemos mais de baixo da Lei, mas da Graça, fica difícil encontrar uma
saída teológica para o dízimo. Duas atitudes são tomadas diante disso. A
primeira é simplesmente fechar os olhos para esta realidade e cobrar o dízimo
de qualquer forma, alegando que é um mandamento do Senhor, citando diversos
textos do Antigo Testamento, sem espaço para discussão. Ou dá ou sai da igreja.
A
segunda é um pouco mais bem elaborada e apela para o fato de que Abraão deu o
dízimo a Melquisedeque antes de existir lei (Gn 14:18-24), e que, da mesma
forma, Jacó prometeu o dízimo a Deus sem lei alguma (Gn 28:18-22). Nota-se que
nesses dois casos não havia alguma lei ou regra referente ao dízimo, isto é,
nenhuma obrigação moral ou religiosa de separar dízimos para dar a Deus. Os
dízimos oferecidos por Abraão e Jacó foram totalmente voluntários. Eles não
deram o dízimo para que Deus os abençoasse, mas justamente pelo fato de terem
sido abençoados por Deus. O dízimo foi, então, fruto de um coração agradecido
pelas bênçãos recebidas. Outra coisa importante: Abraão e Jacó não esperavam
receber nada em troca daquilo que haviam oferecido espontaneamente a Deus.
Embora estes dízimos dados antes da
Lei seja verdade, o sacrifício também é anterior à Lei (Ex 3:18; 5:17) e também
a circuncisão (Gn 17:10; 21:4). A circuncisão era o símbolo máximo da aliança
de Deus com o seu povo, o modo que o judeu mostrava a sua submissão e
obediência a Deus. Não existia judaísmo sem circuncisão. Ainda outros
argumentos apelativos são usados para insistir na cobrança do dízimo no Novo
Testamento, e o argumento é sempre o mesmo: mostra-se no Novo Testamento, em
geral nos Evangelhos, práticas da lei por parte de Jesus ou dos seus discípulos
para afirmar que eles cumpriam a lei e, portanto, nós devemos dar o dízimo. Eis
alguns exemplos:
·
Lc
1:15 – O anjo Gabriel consagrou João Batista ao nazireado, conforme Nm 6:3;
·
Lc
2:21 – Jesus é circuncidado obedecendo ao disposto em Lv 12:3;
·
Lc
2:22 – Maria se purifica conforme estabelecido em Lv 12:4;
·
Lc
2:23 – Os pais de Jesus oferecem o sacrifício prescrito em Lv 12:6-8;
·
Mt
8:4 – Jesus manda um leproso fazer o sacrifício prescrito em Lv 14;
·
Lc
19:8 – Zaqueu se submete duplamente a pena estabelecida em Ex 22:9;
·
Mt
17:24 – Jesus paga o imposto estipulado em Ex 30:11-16;
·
Mt
26:17 – Jesus e seus discípulos preparam a páscoa cumprindo o requerido em Ex
12:1-27.
Essas
situações não mostram que, por causa delas, devemos guardar o dízimo prescrito
antes e depois da lei. Vivemos sob a graça (Rm 6:14). Para aceitar a obrigação
do dízimo, precisamos concordar que as leis prescritas nos textos acima ainda
são validas. Mas quem está disposto a circuncidar-se para cumprir Levítico
12:3? Que casal oferece os sacrifícios prescritos na lei em Levítico 12:6-8
após o nascimento de um filho? Que contraventor convertido, por mais
arrependido que esteja, está disposto a cumprir Êxodo 22:9 como Zaqueu?
Ou
ainda, quem observa alguns mandamentos do Novo Testamento sem uma boa
interpretação deles, como: arrancar os olhos e cortar as mãos (Mt 5:29,30),
voltar a outra face (Mt 5:39), entregar a capa (Mt 5:40), andar duas milhas (Mt
5:41), não tocar trombeta ao dar esmolas (Mt 6:1), orar trancado no quarto (Mt
6:6), não poupar dinheiro ou fazer investimentos (Mt 6:19,20), não dar o que é
santo aos cães nem jogar pérolas aos porcos (Mt 7:6)? É preciso compreender o
que Deus está nos falando, sabendo que mesmo alguns mandamentos do Novo
Testamento não podemos observá-los hoje, ao menos ao pé da letra.
Os
textos citados no antepenúltimo parágrafo dizem respeito à Antiga Aliança, à
Lei de Moisés, as quais estavam sujeitos João Batista, José, Maria, Jesus e
Zaqueu. Eles pertenciam à nação de Israel, eram judeus e por isso deveriam
cumprir todos os preceitos ordenados na Lei. Eles jamais poderiam se negar a
isto, a não ser que estivessem desejando rebelar-se contra Deus. A partir do
livro de Atos, entretanto, não vemos mais o cumprimento desses preceitos e de
quaisquer outros referentes à Antiga Aliança, pois Jesus Cristo, por meio do
seu sacrifício na cruz, cumpriu a Lei por nós que jamais poderíamos cumprir,
restaurou a nossa comunhão com Deus, nos tornou filhos de Deus pelo Espírito
Santo que nos outorgou e nos deu completa remissão dos pecados. Não somos mais
sujeitos à Lei mosaica, mas à lei da Graça, do amor de Deus em Cristo Jesus.
O dízimo no Novo Testamento
É
preciso atentar para o fato de que no Novo Testamento não existe um único
mandamento que ateste a existência da cobrança do dízimo. Qualquer estudante
leigo da Bíblia poderá comprovar isso. Se para defender o pagamento do dízimo
fosse utilizado apenas o Novo Testamento, muitos pastores, principalmente os da
Teologia da Prosperidade, teriam de se esforçar bastante para chegar a uma
teologia razoável, e quando chegassem, estariam na categoria dos falsos mestres.
Na
verdade, as únicas vezes em que o dízimo aparece no Novo Testamento, não se
refere a qualquer mandamento a respeito da obrigação de dizimar do cristão. Em
Lucas 11:42, o Senhor Jesus critica os fariseus por causa da sua religiosidade,
que colocava a observância dos preceitos cerimoniais da lei acima do objetivo
principal que estava sendo negligenciado: a prática da justiça e o amor ao
próximo. Quando Jesus diz que eles deveriam dar o dízimo e observar também
estas coisas, devemos nos lembrar que eles eram judeus e que Jesus Cristo não
havia ainda inaugurado a Nova Aliança com o seu sangue. Ainda não havia igreja,
mas Templo. Todavia, a ênfase de Jesus não é sobre dar ou não o dízimo, mas a
prática correta da Lei e da solidariedade, que está implícita na Lei.
Em Lucas 18:12 o dízimo aparece como
um dos motivos de orgulho do fariseu soberbo. Quanto a Hebreus 7:1-10, existe
um argumento de que se trata de uma amostra de que o dízimo é uma dívida que
temos que “pagar” a Deus. Entretanto, o autor de Hebreus não está fazendo
nenhuma apologia à cobrança do pagamento de dízimos, mas apenas comparando o
caráter imutável do sacerdócio de Cristo com a transitoriedade do sacerdócio
levítico, bem como de toda a Lei. Ele diz: “Porque a lei constitui sumos
sacerdotes a homens sujeitos à fraqueza, mas a palavra do juramento, que foi
posterior à lei, constitui o Filho, perfeito para sempre” (v. 28; cf. 2:10).
Mais
adiante, no cap. 9, ele fala acerca das ofertas oferecidas pelos sacerdotes no
Templo. Então quer dizer que devemos, por isso, oferecer sacrifícios a Deus no
Templo como eram oferecidos no Novo Testamento? De modo algum! Mas: “É isto uma
parábola para a época presente; e,
segundo esta, se oferecem assim dons como sacrifícios, embora estes, no tocante
à concupiscência, ineficazes para aperfeiçoar aquele que presta culto. E que
não passam de ordenanças da carne, baseadas somente em comidas e bebidas e
diversas abluções, impostas até o tempo
oportuno de reforma” (vs. 9,10). Como todo o resto, o dízimo era ineficaz,
imposto e, por isso, foi reformado, por ser apenas sombra do que viria e por
não poder tirar os pecados do povo. Algo que é reformado se renova. Os vs. 12 e
16 encerram a questão: “Pois, quando se muda o sacerdócio, necessariamente há
também mudança de lei... (pois a lei nunca aperfeiçoou coisa alguma),e, por
outro lado, se introduz esperança superior, pela qual nos chegamos a Deus”.
Está bastante evidente que não somente a lei do dízimo foi abolida por Cristo
na cruz, mas toda a lei mosaica. Se nós vivemos na nova e superior esperança,
por que haveríamos de nos submeter àquilo que é antigo e obsoleto?
Hoje vivemos no tempo reformado,
como atesta o autor de Hebreus: “Ora, visto que a lei tem sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas,
nunca jamais pode tornar perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios
que, ano após ano, perpetuamente eles ofereciam... Jesus, porém, tendo
oferecido, para sempre, um único sacrifício pelos pecados, assentou-se à destra
de Deus... Porque com uma única oferta aperfeiçoou para sempre quantos estão
sendo santificados” (10:1,12,14). Que dívida ainda temos para com Deus se
Cristo já pagou tudo o que devíamos na cruz? (cf. Cl 2:14). O que damos a Deus
– isto é, a nossa vida – não é uma dívida, mas é fruto da nossa conversão, do
Espírito Santo que habita em nós e do nosso compromisso com o seu Reino.
Uma revista de escola dominical da
LERBAN, formulada pelo pastor João Leão dos Santos Xavier, traz o seguinte
ensinamento acerca do dízimo no Novo Testamento:
Jesus
não ab-rogou o dízimo. Ele recomendou que os fariseus observassem os principais
preceitos da lei, sem abandonar a prática do dízimo, ainda que das coisas
mínimas (Mt 23.23). Jesus, Paulo, Pedro e outros apóstolos, por serem judeus, é
claro, dizimavam. Talvez seja esta a razão pela qual não temos mais escritos
sobre o dízimo no Novo Testamento.[1]
A
sentença “Talvez seja esta a razão” indica que o referido pastor trabalha com conjecturas
e não tem base teológica para comprovar a sua suposição. Antes de partirmos
para a parte final do nosso estudo acerca da obrigatoriedade do dízimo para
nós, cristãos, levantaremos aqui algumas considerações a respeito desta
citação.
·
Como
já dissemos, ao confrontar os fariseus com a sua prática hipócrita, Jesus não
tinha ainda inaugurado pelo seu sangue a Nova Aliança. Tanto os judeus quanto o
próprio Jesus naquele momento estavam debaixo da lei mosaica e sujeitos a ela,
o que significava dar o dízimo. Porém, não há nenhum texto da Bíblia que mostre
Jesus ou um dos seus apóstolos “pagando” o dízimo. Todavia, encontramos o
Senhor pagando tributos a Cesar (cf. Mt 17:24-27; 22:15-22). Devemos, então,
pagar tributos a Roma, já que o Senhor também pagou? Os tributos que pagamos
devemos ao nosso governo (Município, Estado, País).
·
Está
claro que o objetivo de Jesus ao confrontar os fariseus não era pregar sobre a
necessidade de dar o dízimo, mas denunciar publicamente a sua religiosidade
hipócrita. Aliás, todos os Evangelhos trazem diversos mandamentos do Senhor,
acima de tudo aqueles relacionados ao amor ao próximo e a obediência aos seus
mandamentos. Todavia, não encontramos nenhum mandamento relacionado aos
dízimos. Não obstante, as duas únicas ordenanças que poderíamos chamar de
“rituais” externos que o Senhor nos deixou foram o batismo e a ceia do Senhor.
Entretanto, esses dois só são ministrados uma vez que o interior do homem já
foi transformado pela conversão.
·
O
referido pastor diz que, como judeus, tanto Jesus como os seus discípulos
deveriam pagar o dízimo. Entretanto, devemos lembrar que o dízimo não diz
respeito às leis civis do povo judeu como nação, mas à lei cerimonial do
judaísmo como religião, embora ela também atendesse a um apelo social. O que
está em vista na abolição da lei pela graça não é uma questão de mudança de
nacionalidade, mas de posição espiritual diante de Deus: de condenados a
salvos. Sendo judeus eles deveriam dar o dízimo, mas sendo “cristãos” ainda
deveriam fazê-lo? Os próprios judeus estão desobrigados de dar o dízimo ou de
praticar qualquer outra coisa referente à Lei mosaica ao se converterem a
Cristo (cf. Hb 8:6,7; 9:18-20; Jr 31:31; 2 Co 3:6). Contudo, como rejeitaram a
Cristo como Messias, permanecem ainda nestas mesmas práticas, isto é, sob
maldição e condenados. Ora, se nem os judeus são obrigados a observar a Lei,
porque nós, cristãos gentios, deveremos ser? E se os apóstolos eram obrigados a
dar o dízimo, por que nenhum deles deixou qualquer mandamento específico sobre
isto?
O cristão é obrigado a pagar o
dízimo?
Dos
questionamentos acima surge o ponto crucial do nosso estudo. Se o dízimo é uma
prescrição da Lei e não há no Novo Testamento qualquer mandamento específico
que nos obrigue a “dizimar na casa do Senhor”, somos realmente obrigados a
“pagá-lo” ou “devolvê-lo”? A resposta está clara: O CRISTÃO NÃO É OBRIGADO,
BIBLICAMENTE, A PAGAR (DEVOLVER) O DÍZIMO.
O
dízimo como tem sido ensinado nas igrejas evangélicas e acima de tudo nas
denominações ligadas à Teologia da Prosperidade, e a forma absurda e abusiva
como ele é cobrado em alguns casos – como na Igreja Universal do Reino de Deus
– não passa de uma doutrina de homens, tomando por base uma visão completamente
distorcida da Bíblia. Nenhum cristão deve se sentir inseguro quanto a receber
as bênçãos do Senhor nem temer ser amaldiçoado ou destruído pelo devorador caso
deixe de contribuir com o dízimo. Não há mais nenhuma condenação para aqueles
que estão em Cristo Jesus (Rm 8:1) e que são abençoados por ele com toda sorte
de bênção espiritual nas regiões celestes (Ef 1:3). Também é errado afirmar que
o cristão que não dá o dízimo está roubando a Deus. Essas coisas são, na
verdade, parte de uma pressão psicológica que alguns pastores fazem para que os
fiéis se sintam culpados e amedrontados e jamais deixem de pagar o dízimo.
Aquilo
que devemos ou não cumprir do Antigo Testamento diz respeito a duas situações:
Lei e Graça, Antiga e Nova Aliança; diz respeito, também, a duas religiões
distintas: judaísmo e cristianismo. Embora Deus seja o mesmo em todos os casos
e todos façam parte de uma única e eternamente abrangente revelação de Deus, a
nossa interpretação da Bíblia deve nos mostrar o que ainda está em vigor e o
que é obsoleto. Essa é a grande dificuldade da maioria dos leitores comuns da
Palavra de Deus e de muitos pregadores sem conhecimento teológico básico. Não
fazem distinção alguma entre os dois Testamentos como revelação de Deus. No
entanto, fazem uma seleção conveniente daquilo que deve ser esquecido do Antigo
Testamento e aquilo que deve perdurar, principalmente no tocante aos dízimos.
O fim da Lei é
Cristo
Como vimos, o dízimo era uma questão
judaica e era dado para o sustento do Templo e daqueles que ministravam dentro
dele. Um texto-chave para a nossa compreensão é Gálatas 3:24, que diz: “De
maneira que a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo, a fim de que
fôssemos justificados pela fé”. A palavra “aio” vem do termo grego paidagogos e significa, segundo
Rienecker e Rogers, “guardião”, “tutor”, referindo-se a “um escravo empregado
por famílias gregas e romanas para se encarregar dos meninos entre 6 e 16 anos,
cuidando do seu comportamento, e acompanhando-o sempre que saía de casa, indo,
por exemplo, à escola[2]”.
De forma figurada, Paulo está
dizendo que o objetivo da Lei era nos conduzir a Cristo. Mas ela não podia
tirar o pecado, somente Jesus. Quando o Senhor Jesus veio ao mundo e cumpriu a sua
missão redentora, Ele nos libertou da tutela da Lei e nos deu a vida pela fé:
“Mas tendo vindo a fé, já não permanecemos subordinados ao aio” (v. 25). Em
outras palavras, o cristão não está mais obrigado a permanecer subordinado à
Lei que o escravizava, pois Cristo cumpriu a Lei em seu lugar, algo que ele,
sem Cristo, jamais poderia fazer. E se Cristo cumpriu a Lei que apontava para
Ele próprio e cancelou o escrito de dívida que era contra nós “e que constava
de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removendo-o inteiramente e
cravando-o na cruz” (Cl 2:14), por que ainda devemos estar submissos à Lei?
Uma
vez que Cristo aboliu a Lei e instaurou uma Nova Aliança, alcançou para nós a
perfeição que fora impossível por intermédio da Lei, tornando-se sacerdote para
sempre de uma Aliança superior (Hb 7:11,20-28), onde já não há mais necessidade
de Templo, do sacerdócio levítico, da circuncisão, dos sacrifícios pelos
pecados e dos dízimos. O autor de Hebreus diz: “Ora, a primeira aliança também
tinha preceitos de serviço sagrado, e o seu santuário terrestre” (9:1). E mais
adiante afirma: “Quando, porém, veio Cristo como sumo sacerdote dos bens já
realizados, mediante o maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos,
quer dizer, não desta criação, não por meio de sangue de bodes e bezerros, mas
pelo seu próprio sangue, entrou no Santo dos Santos, uma vez por todas, tendo
obtido eterna redenção” (vs. 11,12). O mesmo autor sagrado assevera: “Ora,
visto que a lei tem sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas,
nunca, jamais pode tornar perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios
que, ano após ano, perpetuamente, eles oferecem” (10:1). E acerca do sacrifico
de Cristo, ele conclui: “Jesus, porém, tendo oferecido para sempre um único
sacrifício pelos pecados, assentou-se à destra de Deus (...) Por uma única
oferta aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados” (vs. 12,14).
Paulo
escreve aos colossenses: “Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e
bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir;
porém o corpo é de Cristo” (2:16,17). Ora, o dízimo não fazia parte desta mesma
Lei que prescrevia os costumes e festas judaicos? Paulo acrescenta:
Se morrestes com
Cristo para os rudimentos do mundo, por que, como se vivêsseis no mundo, vos
sujeitais a ordenanças: não manuseies isto, não proves aquilo, não toques
aquiloutro, segundo os preceitos e doutrinas dos homens? Pois que todas estas
coisas, com o uso, se destroem. Tais coisas, com efeito, tem aparência de
sabedoria, como culto de si mesmo, e de falsa humildade, e de rigor ascético;
todavia não tem valor algum contra a sensualidade.[3]
Paulo não está se referindo apenas à
Lei escrita por Moisés, mas a todas aquelas coisas que os judeus ajuntaram a
ela no passar dos tempos, uma margem de erro para impedir que eles a
descumprissem e que se transformava numa religiosidade vã e vazia. O dízimo
quase sempre funciona da mesma forma: o crente é valorizado e tido como fiel a
Deus e espiritual, merecedor de ricas bênçãos e capaz de obter sucesso na sua
vida pessoal quando dá o dízimo regularmente e as ofertas requeridas pelos
pastores. Paulo mostra, porém, que viver desta forma é desprezar a obra de
Cristo. Ensinar a observação do Antigo Testamento sem levar em conta que “o fim
da lei é Cristo”, é fazer o cristianismo voltar às antigas práticas judaicas,
anulando a cruz de Cristo, blasfemando contra o Espírito e decaindo da Graça.
Em
Cristo, portanto, fomos libertos da lei do pecado e da morte (Rm 8:2). Antes
estávamos encarcerados pela Lei (Gl 3:23), mas agora, libertos, vivemos sob a
lei de Cristo (Gl 6:2). Todas as ordenanças da Lei serviam apenas de aio para
nos conduzir a Cristo (Gl 3:24). Agora que estamos em Cristo, não estamos mais
debaixo da Lei – a não ser a lei moral – nem obrigados a guardá-la, porque Cristo
já a cumpriu por nós. Aquilo que estava contra nós foi encravado na cruz (Cl
2:14). O dízimo é parte desta Lei e serviu ao seu propósito enquanto a Lei
ainda existia. Como mandamento, ele faz parte da lei judaica e não da lei da
Graça. Hoje já não existe uma casta sacerdotal que assiste no Templo, pois ele
já não existe e cada crente é um sacerdote do Senhor (cf. 1 Pe 2:9; Ap 1:6). Se
aqueles que defendem o pagamento obrigatório do dízimo o fazem em obediência à mosaica,
devem ter em mente três coisas: estão debaixo de maldição (Gl 3:10), estão
obrigados a guardar toda a Lei (Gl 5:3), e decaíram da Graça (Gl 5:4).
Enquanto que na Lei uma das razões
da bênção do judeu era a consequência da sua obediência evidenciada através do
pagamento dos dízimos e das ofertas, na Nova Aliança as bênçãos de Deus são
decorrentes do sacrifício de Cristo na cruz (Ef 1:3). O que era velho foi
jogado fora para dar lugar ao novo (Gl 4:30; Hb 8:13). A cobrança do dízimo para
o cristão pode ser uma forma de manter o crente escravo da Lei: ele precisa dar
o dízimo para mostrar a sua fidelidade, para provar a sua obediência, para
testemunhar de que não está em pecado ou possuído por Satanás, e para impedir
que Deus se vire contra ele e solte o devorador para consumir a sua bênção,
como sugerem os pregadores da Prosperidade. Todavia, Paulo diz aos gálatas:
“Sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim
mediante a fé em Cristo Jesus, também temos crido em Cristo Jesus, para que
fossemos justificados pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras
da lei, ninguém será justificado” (2:16). O Senhor Jesus já fez tudo por nós ao
pagar pelos nossos pecados.
Quando lemos a epístola de Paulo aos
gálatas, nos deparamos com uma realidade parecida com a atual. Aquela igreja
estava recebendo ensinamentos contrários ao Evangelho da Graça. Judeus que
haviam se convertido ao cristianismo insistiam que era necessário que aqueles
irmãos se sujeitassem primeiro à Lei de Moisés, através da circuncisão, para
somente depois se tornarem cristãos. Paulo, então, escreve para combater essa
heresia e se impressiona com o fato de aqueles crentes estarem abandonando a
verdade para dar lugar à mentira: “Admira-me que estais passando tão depressa
daquele que vos chamou na graça de Cristo, para outro evangelho” (1:6). Ele
pergunta indignado: “Ó gálatas insensatos! Quem vos fascinou a vós outros,
antes cujos olhos foi Jesus Cristo exposto como crucificado? Quero apenas saber
isto de vós: recebestes o Espírito pelas obras da lei, ou pela pregação da fé?”
(3:1,2).
Como já vimos, não há como sustentar
a idéia do dízimo com a justificativa de que ele é anterior a lei, porque a
circuncisão que Paulo tanto combate nesta epístola também é. Ele diz ainda: “De
novo testifico a todo homem que se deixa circuncidar, que está obrigado a
guardar toda a lei” (5:3). Se em Cristo a promessa feita a Abraão foi cumprida
e também a Lei de Moisés teve o seu fim, de modo que a circuncisão não tem mais
efeito, por que a cobrança obrigatória do pagamento do dízimo deve continuar?
Terá sido o sacrifício de Cristo imperfeito? Ou que base poderemos ter para
justificar que Cristo não cumpriu toda a Lei, mas apenas parte dela? Ora, toda
a Lei não apontava para Cristo, ou o dízimo é uma exceção?
Portanto, cobrar o dízimo do cristão
tomando por base o Antigo Testamento é antibíblico e constitui-se uma heresia,
um falso ensinamento. Pregadores que querem instituir o dízimo sem essa
conotação de exigência, afirmam que quando “damos” o dízimo, estamos
“devolvendo” a Deus parte daquilo que Ele nos deu. Entretanto, esses mesmos
pregadores fiam-se em Malaquias 3:6-12, ensinando que se não “devolvermos” uma
parte para Deus, Ele não nos abençoará e não poderá nos livrar do devorador.
Todavia, conforme estudamos no início, o dízimo não era uma devolução daquilo
que Deus havia dado, mas uma exigência para a manutenção do Templo e para os
levitas, além de ajudar aos estrangeiros, os órfãos e as viúvas. No Novo
Testamento não existe mais templo nem qualquer sacerdócio do tipo do Antigo
Testamento. Na Nova Aliança o que há é o sacerdócio universal dos crentes. Pela
lógica, então, deveríamos dar o dízimo a nós mesmos como sacerdotes (Ap 5:10) e
santuários do Espírito Santo (1 Co 3:16; 6:19; Ef 2:21). O absurdo dessa ideia
vem apenas confirmar que não existe mais razão para darmos o dízimo.
A ausência de doutrinas sobre o
dízimo no Novo Testamento
Algo que podemos nos perguntar é por
que o Novo Testamento se cala quanto a obrigatoriedade do dízimo. Por que não
existe nele nenhum ensinamento direto, nenhum imperativo quanto ao dízimo se,
conforme dizem, ele era tão importante para o povo de Deus na Antiga Aliança e
os cristãos do primeiro século, e se ele faz parte, como insistem, de uma
aliança perpétua entre Deus e o seu povo e era necessário para que as bênçãos
do céu fossem derramadas?
Como
já tivemos a oportunidade de ver, o pastor João Leão dos Santos Xavier levantou
a suposição de que a razão desse silêncio a respeito do dízimo no Novo
Testamento é o fato de que Jesus, Paulo e Pedro, que eram judeus, davam
naturalmente o dízimo. O referido pastor só esqueceu de dizer que a partir do
momento que Cristo, com o seu sangue, selou a Nova Aliança e derramou o seu
Espírito Santo, Paulo, Pedro e os demais apóstolos se tornaram judeus apenas de
nacionalidade, mas não mais de fé. Agora eles eram “cristãos.” Mas podemos,
também, apresentar algumas “suposições” mais próximas da realidade bíblica que
justificam o fato de não a ver mais escritos sobre o dízimo no Novo Testamento:
- Não é somente o dízimo que
some do rol de doutrinas a partir do Novo Testamento. Sendo inaugurada a
Nova Aliança em Cristo, também não vemos mais prescrições quanto ao
serviço do Templo, a abstinência de certos tipos de alimentos, a
circuncisão, os sacrifícios e as ofertas pelo pecado, os rituais de
purificação e nenhuma das cerimônias ou festas judaicas. O motivo disto
está claro e basta lermos, por exemplo, o livro de Gálatas, que condena os
judaizantes que pregavam a circuncisão para o cristão; o livro de Hebreus
que coloca para sempre uma pedra sobre a Antiga Aliança em face da
superioridade da pessoa e do ministério de Cristo; ou o livro de Romanos,
onde Paulo afirma que “o fim da lei é Cristo” (10:4).
- A ausência de doutrinas
relativas à obrigatoriedade do dízimo está comprovada, também, no fato de
que não há mais necessidade do Templo nem do sacerdócio levítico. O
templo, inclusive, foi destruído em 70 d.C. Essas coisas, para o crente em
Cristo Jesus, perdem totalmente o seu significado e importância. E se a
lei do dízimo se refere a elas, como os apóstolos, como cristãos que
rompiam com a religião judaica e pregavam a abolição da lei pela Graça de
Deus, poderiam arrecadar dízimos e simplesmente levá-los ao Templo, porque
este deveria ser o destino dos dízimos? Seria no mínimo incoerente. Outra
questão que nos faz repensar de vez a obrigatoriedade do dízimo é
justamente o fato de ter sido ele estipulado na lei – ou antes dela, tanto
faz – para ser levado ao Templo, e não à Igreja. Ele não era, na lei, destinado
a cristãos, mas a judeus que ministravam no Templo. Logo, se os defensores
do dízimo querem continuar cobrando-o dos seus fiéis, deveriam levá-lo à
sinagoga mais próxima da sua denominação e entregá-lo aos rabinos que lá
assistem.
Estas
nossas “suposições” já são suficientes para tentarmos justificar a ausência de
doutrinas acerca do dízimo no Novo Testamento. Algo que não podemos perder de
vista de forma alguma é que o dízimo não é A LEI, mas apenas um dos aspectos da
Lei. Não foi somente a obrigatoriedade do dízimo que desapareceu da prática dos
convertidos. Nos Evangelhos, nas epístolas e no livro de Apocalipse não
encontramos Jesus ou qualquer um dos apóstolos praticando e ensinando, por
exemplo, a circuncisão em obediência a Gênesis 17:23-27; o sacrifício
de animais em holocausto como observância de Levítico, capítulos do 1 até 6:8-13; a santificação do sábado, em
obediência a Levítico 23:3; e, apesar
de ter sido apedrejado algumas vezes, Paulo jamais ensinou a prática de
apedrejamento dos adúlteros com base em Levítico 20:10 e Deuteronômio 22:22. Esses mandamentos, tão
importantes quanto o dízimo, sequer são mencionados.
Mas
como afirmamos no início, isto não nos isenta da responsabilidade e do prazer
de contribuir para a obra do Senhor, afinal, conta de água e de luz não são
pagas por meio de oração e jejum, mas da contribuição financeira amorosa dos
irmãos. Tanto o ministério de Jesus Cristo (Jo 12:6), quanto o de Paulo eram
sustentados pelos irmãos da igreja. Paulo, por sua própria vontade, recusava-se
a receber salário dos irmãos, mas sempre que necessário eles o ajudavam nas
suas tribulações e até financiavam o seu ministério (cf. 1 Co 9; 2 Co 11:8; 1
Tm 5:18; Fp 4:15-20). Na parte dois do nosso estudo encontraremos o modo
bíblico de contribuição financeira para a obra do Senhor.
bibliografia
RIENECKER, Frtitz; ROGERES, Cleon. Chave linguística do Novo Testamento grego.
São Paulo: Vida Nova, 1995.
XAVIER,
Pr. João Leão dos Santos. Passo a passo
com Cristo: base doutrinária para os seus primeiros passos na vida cristã, LERBAN,
DF.
Olá, Boa Noite Mizael Souza. A minha pergunta é: As suas últimas considerações em relação às contribuições na igreja, são providas de fé? O Senhor, com dez quilos de papel, provou o que? Pra mim, não falou nada, pois, perdoe-me, mas dízimo é algo do crente para Deus e de Deus para o crente, é sintonia, é amor, é desejo de ver as portas do Templo abertas e com estrutura para receber o pecador, é ser testemunha de salvação aqui na terra. É a vontade de Deus, para o sustento da Sua Casa e os fiéis dizimam e ofertam com alegria e fidelidade, pois conhecem o Deus Vivo. E são poderosamente abençoados por Deus.Eu só lamento por você não ter tido essa revelação na sua vida(talvez, se usar mais o seu tempo para adorá-LO) consegue. Em Apocalipse 22-18 e 19 dá uma chegada lá. Um abraço e desejo que você mude de idéia e se prepare de verdade, pois Jesus vem....
ResponderExcluirBoa tarde. Em primeiro lugar quero lhe agradecer a visita ao meu blog e mais ainda ao seu comentário. Não foram 10kg de papel, mas muita oração e estudo. Gostaria de lembrar-lhe que este estudo é apenas parte de um bem maior e mais completo, onde defendo tudo o que você acabou de me falar. Só que no meu estudo se leria assim:
Excluir"Pra mim, não falou nada, pois, perdoe-me, mas OFERTA é algo do crente para Deus e de Deus para o crente, é sintonia, é amor, é desejo de ver as portas do Templo abertas e com estrutura para receber o pecador, é ser testemunha de salvação aqui na terra. É a vontade de Deus, para o sustento da Sua Casa e os fiéis OFERTAM com alegria e fidelidade, pois conhecem o Deus Vivo. E são poderosamente abençoados por Deus".
Não nego que na maioria das igrejas o dízimo é incentivado com motivação santa e ofertado com amor e liberalidade. Mas o meu intuito principal no estudo é combater a Teologia da Prosperidade, onde o dízimo é uma obrigação de vida ou morte, uma chave para os cofres celestiais. DÍZIMO ou OFERTA, isso não existe para NOS ABENÇOAR, mas para abençoar aqueles que o receberão. O crente deve, SIM, contribuir financeiramente com a Igreja, pois sua contribuição, em igrejas sérias, gerará investimento em vidas, em missões, sustentará o pastor, pagará conta de água e luz e poderá ser revestido para a responsabilidade social.
Espero ter o prazer de conversarmos mais.
Mizael Souza.
Boa tarde. Em primeiro lugar quero lhe agradecer a visita ao meu blog e mais ainda ao seu comentário. Não foram 10kg de papel, mas muita oração e estudo. Gostaria de lembrar-lhe que este estudo é apenas parte de um bem maior e mais completo, onde defendo tudo o que você acabou de me falar. Só que no meu estudo se leria assim:
ResponderExcluir"Pra mim, não falou nada, pois, perdoe-me, mas OFERTA é algo do crente para Deus e de Deus para o crente, é sintonia, é amor, é desejo de ver as portas do Templo abertas e com estrutura para receber o pecador, é ser testemunha de salvação aqui na terra. É a vontade de Deus, para o sustento da Sua Casa e os fiéis OFERTAM com alegria e fidelidade, pois conhecem o Deus Vivo. E são poderosamente abençoados por Deus".
Não nego que na maioria das igrejas o dízimo é incentivado com motivação santa e ofertado com amor e liberalidade. Mas o meu intuito principal no estudo é combater a Teologia da Prosperidade, onde o dízimo é uma obrigação de vida ou morte, uma chave para os cofres celestiais. DÍZIMO ou OFERTA, isso não existe para NOS ABENÇOAR, mas para abençoar aqueles que o receberão. O crente deve, SIM, contribuir financeiramente com a Igreja, pois sua contribuição, em igrejas sérias, gerará investimento em vidas, em missões, sustentará o pastor, pagará conta de água e luz e poderá ser revestido para a responsabilidade social.
Espero ter o prazer de conversarmos mais.
Mizael Souza.
geneses 26.5 nos prova que dizimos sempre foi lei, por isso o argumento de que dizimos são antes da lei está equivocado, tudo o que Deus falava já se tornava mandamento, regras de conduta, preceitos e lei. Abraão dizimou apenas fora da formalidade que veio depois através da escritura de Moisés. Por que Abraão deu o dizimo ao Melquizedeque? Ele pagou o dizimo a Melquizedeque não porque o sarcedote do Deus Altissimo fosse uma representação de Cristo para que hoje fizessemos o mesmo, mas porque já trazia em seus lombos a lei da ordem sarcedotal Levitica ( hebreus 7.10). Um outro detalhe interessante é que o dizimo sendo uma lei cerimonial e com aspectos sociais e com destino a concentração no Templo terreno e temporario ( a casa do tesouro)que era objeto de adoração(templo) mostra que não pode aperfeiçoar ninguem, mas somente um pode Jesus Cristo o verdadeiro Templo da Gloria de Deus (João 2.20e21)que foi derribado e levantado ao terceiro dia, cujo o véu foi rasgado (Marcos 15.38)representando sua carne (hebreus 10.20)que nos da a vida Eterna e a liberdade na Graça,de termos todas as bençãos espirituais em Jesus Cristo para Gloria de Deus Pai.Co-relacionando eu digo o que Pedro disse: Meu mestre não paga as didracmas!!! Por que Jesus já com seus 30 anos nunca tinha pagado as didracma? simples porque é Filho de Deus assim como somos nele (Mateus 17.26).Obs: Didracmas era moeda de prata de 7 gramas, eram primicias e imposto pago ao templo de Jerusalém.
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