terça-feira, 3 de novembro de 2020

COMPONENTES DA RESILIÊNCIA


 
Durante os meus anos de vida e de conversão a Jesus, já tive a oportunidade de praticar a resiliência em diversas fases e momentos. Precisei superar complexos arraigados à minha personalidade causados por anos sob a opressão do bullying. Precisei me esforçar para vencer decepções na área afetiva. Precisei lutar contra a frustração causada pelo desemprego e as humilhações que tive de suportar. Precisei manter a minha sanidade após a perda da minha casa, do meu lar. Olhando para as lutas de tantas pessoas com quem convivi e que aconselhei durante todos esses anos, desde minha conversão, em 1994, sinto que minhas batalhas não foram tão grandes assim. Histórias de abandonos, abusos, violência doméstica, o suicídio da filha jovem de uma amiga, a luta de um irmão da igreja contra o câncer, o luto pelo esposo falecido, a batalha com o irmão alcoólatra e tantos outros eventos que chegam a doer o coração.

Seja em tudo que vivi e aquilo que vivenciei através dos depoimentos e desabafos de outras pessoas, a resiliência aparece como um elemento decisivo para a história de vida de cada um. Assim como experimentei a verdadeira superação, vi outras pessoas superarem; mas assim como ainda luto para vencer algumas situações, também vejo muitos na mesma luta. Se problemas sempre existirão, a necessidade de resiliência também. Ser resiliente em determinada situação não é garantia que sejamos em todas, porque todas serão diferentes. A garantia que temos é sempre sairemos fortalecidos e mais sábios para enfrentar novas reveses com mais assertividade. Com o passar do tempo e das dores, criamos um arsenal emocional, intelectual e espiritual que iremos utilizar mais adiante. Além disso, Deus nos provê um crescimento espiritual constante na prática da sua Palavra e na vivência no Espírito.
A resiliência está ligada diretamente ao nosso comportamento com relação a Deus, a nós mesmos e aos problemas que nos afligem. A nossa atitude diante das tempestades é que determinará a nossa resiliência. Carmello escreve que "o processo de desenvolvimento da resiliência é, basicamente, orquestração dos componentes psicológicos e cognitivos do indivíduo e dos elementos de apoio do ambiente que o cerca" (op. cit., p. 74). O contexto, o indivíduo ou grupo, e o próprio processo fazem parte do processo da resiliência, que também envolve quatro componentes que veremos aqui: condutas, características, fatores de promoção e atributos de sustentação (idem). Isso veremos de maneira introdutória para definirmos o nosso conceito de resiliência e a sua natureza. Todos esses componentes estarão diluídos nos diversos capítulos que se seguirão.
 
 
Padrões de conduta
 
O modo como encaramos a vida revela o tipo de pessoa que somos e o nosso nível de resiliência. Existem pessoas reativas e proativas. As reativas enxergam as crises como obstáculos intransponíveis, vivem assoladas pelas circunstâncias e se deixam abater pelos momentos de tensão. Elas vivem na defensiva, sentindo-se como vítimas, além de serem resistentes às mudanças. As pessoas com maior tendência a ser resilientes são proativas. Elas não vivem se vitimizando nem resistem às mudanças. Pelo contrário: enxergam as crises como oportunidades de crescimento. Apesar de sentirem as mesmas emoções negativas diante da crise que as pessoas reativas, elas não se deixam abalar, confiam em Deus e na sua Palavra. São pessoas positivas, focadas, flexíveis e organizadas.
 
 
Características predominantes em resilientes
 
As pessoas resilientes possuem algumas características inatas ou desenvolvidas ao longo da vida. Tais características, na verdade, também estão naquelas pessoas que não consideramos resilientes, esperando serem acionadas. Com relação à resiliência cristã, somente aqueles que foram regenerados possuem certas características que provém diretamente do Espírito Santo, como o fruto do Espírito e os dons espirituais, cabendo ao cristão lançar mão delas ao se deixar guiar pelo Espírito. As adversidades servem como gatilhos que disparam algo em nós, um sentimento que requer uma ação, uma resposta. A resposta de muitos pode ser a ansiedade e o desespero. O Senhor disse que não devemos andar ansiosos pela nossa vida, porque Deus cuida de nós com amor paternal (6:31-34). O mesmo afirmou o apóstolo Paulo, que nos orienta a entregar todas as nossas petições a Deus para que tenhamos paz (Fp 4:6,7).
O cristão resiliente é protagonista, jamais abandona o palco da sua própria história, mas atua de maneira consciente na resolução dos seus problemas. Ele é criativo ao buscar soluções, sabe ter ideias produtivas e é inovador. Ele também apreciada as mudanças. Isso não quer dizer que ele não tenha medo, mas que não se deixa dominar por ele. Outra característica é a sua elevada autoestima. Ele não se sente um inútil, muito menos fracassado, mas sabe o valor que tem para Deus, conhece suas limitações, mas também seus talentos. O cristão resiliente também é eficaz. Ele não tenta, ele faz. Ele também possui senso de humor, está feliz mesmo em meio às crises, porque a alegria do Senhor é a sua força. Por fim, ele possui equilíbrio emocional, que, segundo Carmello (ibidem, p. 84), é uma "Característica aplicada a pessoas ou grupos que têm capacidade de sentir, entender e aplicar eficazmente o poder e a perspicácia de suas emoções como fonte de energia, informação, conexão e influência humana".
 
 
Fatores de promoção
 
Quando falamos a respeito da resiliência, acima de tudo a cristã, estamos nos referindo a diversos fatores que, sendo somados, concorrem para que ela aconteça. Não podemos esquecer que, como crentes em Cristo Jesus, somos membros do seu corpo, que é a Igreja. Embora falemos na resiliência como algo individual, ela depende da coletividade e se desenvolve a partir dela. Na Igreja ninguém ganha ou perde sozinho. Quando um se machuca, todos sentem e choram com ele; mas se ele é honrado, com ele todos se alegram (1 Co 12:26,27). Somos o tempo inteiro influenciados por Deus, pelas pessoas, pelo ambiente e por nossas próprias disposições interiores. Essas influências servem para melhorar o nosso desempenho e facilitar a conquista dos nossos objetivos. Existem quatro fatores que concorrem para a capacitação para o enfrentamento das situações de crise, com melhor adaptação e abertura às mudanças. São eles:
 
 
Modelo de desafio
 
Esse modelo envolve a maneira como encaramos a realidade, percebendo-nos como protagonistas capazes de operar a transformação que precisamos. Isso envolve a capacidade de reconhecimento da verdadeira dimensão do problema, o reconhecimento das possibilidades de enfrentamento e o estabelecimento de metas para sua solução. Como cristãos, também somos desafiados a confiar no Senhor e na força do seu poder para nos fortalecer (Ef 6:10). Este é um modelo sobrenatural de resiliência do qual o mundo não dispõe. Ele vai além de nós mesmos e nos revela que já somos mais que vencedores em Cristo. Por mais que tenhamos responsabilidades para cumprir no processo de superação e crescimento, é Deus quem opera em nós tanto o querer como o realizar em todas as situações e áreas da nossa vida, segundo a sua boa vontade (Fp 2:13).
 
 
Vínculos significativos
 
Eles estão ligados ao que falamos anteriormente a respeito da dinâmica do corpo de Cristo. Não precisamos carregar sozinhos os nossos fardos, mas podemos e devemos compartilhar com os irmãos na fé as nossas lutas, como eles também compartilharão as suas conosco. A resiliência cristã nos chama à solidariedade, quando levamos as cargas uns dos outros (Gl 6:2) e à comunicação efetiva na busca por soluções. Muitos sofrem calados, não compartilham as suas dores para serem ajudados. Sem o apoio emocional e espiritual necessários, não podemos vencer. Resiliência que surge sem a ajuda mútua não é a resiliência verdadeira. Como veremos neste estudo, somos seres interdependentes.
 
 
Mente solucionadora
 
No capítulo três, quando aprenderemos mais detalhadamente sobre as características do cristão resiliente, começaremos com algo muito importante: a mente. Resiliência é transformação, e esta é impossível sem uma mente transformada. É o que a Bíblia chama de metanoia, como lemos em Romanos 12:1, onde o apóstolo Paulo diz que devemos nos transformar pela renovação da nossa mente. Uma mente transformada está em busca da vontade de Deus. E é isso que o cristão resiliente deve buscar: a vontade de Deus para a sua vida como a força motriz da sua superação. Além disso, uma mente solucionadora é analítica, ela não está focada no problema, mas na sua solução e na oportunidade de crescimento que ele traz consigo. A mente cristã resiliente está impregnada do caráter de Cristo e tende a agir conforme os seus passos. O apóstolo Paulo brilhava esse caminho, por isso era capaz de aconselhar: "Sede meus imitadores, como também eu de Cristo" (1 Co 11:1).
 
 
Sentido de propósito e futuro
 
Esses fatores são característicos da vida daquela que foi salvo para uma "viva esperança" (1 Pe 1:3). Por trás de toda adversidade existe um propósito divino, algo que vem para nos ensinar, corrigir e aperfeiçoar. E o sofrimento como força propulsionadora é a raiz do crescimento cristão: "E o Deus de toda a graça, que em Cristo Jesus vos chamou à sua eterna glória, depois de haverdes padecido um pouco, ele mesmo vos aperfeiçoará, confirmará, fortificará e fortalecerá" (1 Pe 5:10). Como crentes, o nosso propósito maior é glorificar a Deus através da nossa vida, incluindo as dores. Pela fé temos esperança na solução dos nossos problemas, mas vamos bem mais além: temos uma esperança eterna, que não podemos ver, mas que é uma certeza (Tg 5:7,8; 1 Jo 3:3; Rm 5:2; 8:24). Essa esperança é a marca do cristão resiliente. O apóstolo Paulo escreve: "E não somente isto, mas também nos gloriamos nas tribulações; sabendo que a tribulação produz a paciência, e a paciência a experiência, e a experiência a esperança" (Rm 5:3,4).
 
 
Atributos de sustentação
 
Segundo Carmello, os atributos de sustentação "são responsáveis pelo alto grau de adaptação positiva do indivíduo às mudanças, promovendo a preparação e o aprendizado necessários para seu crescimento e fortalecimento" (idem, p. 97). Esses atributos facilitam a sua resiliência, e envolvem:
 
 
Eu sou (crenças, princípios e valores, considerados forças intrínsecas do indivíduo)
 
São as nossas crenças e princípios que determinam as nossas atitudes. Elas envolvem a nossa visão de mundo, a maneira como concebemos e nos relacionamos com tudo ao nosso redor e, acima de nós, Deus. Na resiliência cristã, a nossa cosmovisão está alicerçada sobre a Palavra de Deus. Nós somos aquilo que Deus nos revela: pecadores regenerados e controlados pela sua graça. Somos filhos da luz, logo não andamos mais em trevas. Somos mais que vencedores em Cristo Jesus. Nas palavras do apóstolo Pedro: "Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz" (1 Pe 2:9). Quando vivemos de acordo com esses atributos, estamos prontos para vencer quaisquer obstáculos e crescer.
 
 
Eu estou (estados de ânimo, disposições e posturas, também forças intrínsecas)
 
Por mais abatidos que nos sintamos, jamais nos veremos como derrotados. O apóstolo Paulo se reconhecia como alguém pequeno demais, imerecedor da graça de Deus e da missão que lhe fora confiada. Ele sabia que nele não habitava bem algum, mas conhecia o poder que operava em sua vida, pois a sua suficiência vinha de Deus (2 Co 3:5). As nossas disposições interiores devem refletir o caráter e a coragem de quem é templo do Espírito Santo e cuja força vem do Senhor. Se pessoas comuns costumam superar grandes crises e traumas, muito mais poderá aquele que o Senhor salvou. Assim diz o Senhor: "Não sabes, não ouviste que o eterno Deus, o Senhor, o Criador dos fins da terra, nem se cansa nem se fatiga? É inescrutável o seu entendimento. Dá força ao cansado, e multiplica as forças ao que não tem nenhum vigor. Os jovens se cansarão e se fatigarão, e os moços certamente cairão; mas os que esperam no SENHOR renovarão as forças, subirão com asas como águias; correrão, e não se cansarão; caminharão, e não se fatigarão" (Is 40:28-31).
 
 
Eu tenho (apoio de pares, liderança, cultura, que são atributos do meio em que o indivíduo vive)
 
Este atributo reforça o que já falamos: ninguém luta ou vence sozinho. O meio em que vivemos (família, sociedade, escola, trabalho e até mesmo a igreja) nem sempre nos dão o sustento necessário para superarmos nossas crises, muito pelo contrário. Mas em meio ao caos precisamos encontrar um caminho seguro para trilhar. Sempre haverá pessoas de Deus no nosso caminho. Precisamos contar com os irmãos da igreja, os líderes de ministérios e nossos pastores. Além disso, é necessário escolher com sabedoria quem e o que exercerá influência sobre as nossas escolhas e atitudes: as crises ou a esperança, a setas do inimigo ou o estímulo do Espírito, a vontade da carne ou a Palavra de Deus. Não podemos ser frutos passivos do meio, mas precisamos agir sobre ele e com ele para um crescimento mútuo. Eis o que escreve Tiago: "Está alguém entre vós aflito? Ore. Está alguém contente? Cante louvores. Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sôbre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor; e a oração da fé salvará o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados. Confessai as vossas culpas uns aos outros, e orai uns pelos outros, para que sareis: a oração feita por um justo pode muito em seus efeitos" (Tg 5:13-16). A cura acontece quando beneficiamos uns aos outros.
 
 
Eu posso (aquisição de competências relevantes para a superação dos desafios, relacionando-se às habilidades de aprendizagem e de capacitação)
 
O "eu posso" do cristão está contido na seguinte premissa: "Tudo posso naquele que me fortalece" (Fp 4:13). Ele luta equipado pelo poder do Deus eterno. Este poder também produz conhecimento. A falta de conhecimento promove muitos erros e impossibilita o nosso avanço em meio às crises e na nossa vida espiritual de modo geral. Em primeiro lugar está a falta de conhecimento da Palavra de Deus. O Senhor disse que o seu povo estava sendo destruído porque lhe faltava conhecimento (Os 4:6). Quando abrimos mão de conhecer a Deus por meio da Palavra que Ele nos revelou, deixamos de saber o que Ele espera de nós e a maneira como deseja que realizemos a sua vontade. A vida cristã está em ouvir ou ler e obedecer a Palavra de Deus. Em segundo lugar está a falta de conhecimento a respeito de nós mesmos: os nossos defeitos e qualidades, nossos talentos e habilidades, nossos pontos fracos e nossas forças, nossos dons espirituais e nosso lugar no corpo de Cristo. Esse conhecimento nos faz encarar os problemas de maneira corajosa e assertiva, dando-nos muito maiores condições de superá-los e os instrumentos corretos. Que habilidades e competências precisamos desenvolver?

ESTE ESTUDO É PARTE DO LIVRO "RESILIÊNCIA CRISTÃ", DE MINHA AUTORIA, AINDA EM FASE DE ESCRITA. ESCREVI OUTRO LIVRO QUE É INTEIRAMENTE DEDICADO À RESILIÊNCIA, MAS VOLTADO PARA AQUELES QUE ENFRENTAM O FIM DE UMA RELAÇÃO AMOROSA OU ABUSIVA, EMBORA AS SUAS LIÇÕES SOBRE RESILIÊNCIA SE APLIQUEM PERFEITAMENTE A TODAS AS SITUAÇÕES DA NOSSA VIDA. VOCÊ PODE ADQUIRI-LO EM FORMATO E-BOOK PELA AMAZON:



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