sábado, 13 de abril de 2013

Como enganar o cidadão e fazê-lo votar em você para presidente




(Crônica publicada no Jornal de Natal[1], 03, 10 e 24 de novembro de 1997)


Uma coisa ninguém pode negar: apesar de já haver passado por tantas fases difíceis na política social e econômica do País, vendo ao vivo e a cores tanta safadeza, tanta corrupção, tanta mentira e tanta maracutáia, envolvendo empresários e políticos, que variam desde o vereador até o presidente da República, o cidadão brasileiro ainda é muito fácil de ser enganado, parece ter a memória muito curta.
Para se obter uma prova desta afirmação, basta voltar os olhos para as campanhas eleitorais, onde os políticos se aproveitam da humildade, da “ingenuidade” e da pobreza do povo para comprar a sua dignidade, promovendo verdadeiras carnificinas morais: um chaveirinho e um boné aqui; uma cesta básica e um milheiro de tijolos lá; isto sem contar os cargos públicos adquiridos através de promessas de campanha! Tudo isto e muito mais em troca de apenas uma coisa: o voto!
Quanto vale hoje a dignidade e a moral humana? Onde estão a ética e o caráter do cidadão? Bom, isso não interessa nem um pouco. O que na verdade tem importância é que o ano de 1998 se aproxima e precisamente neste ano haverá eleições para a presidência da República. Você não pode ficar fora dessa jogada. É necessário investir e tirar proveito do cidadão que a cada dia que passa está cada vez mais “enganável”. Afinal, é o cidadão quem vai votar e se ele não votar em você, provavelmente você não será eleito e perderá a grande chance de enriquecer rápido e conhecer o mundo inteiro totalmente de graça. Se você ainda não está pronto para esta empreitada, continue lendo mesmo assim, pois nada melhor que uma eleição após a outra.
Neste meu “manual de destruição para a vida”, você encontrará dicas preciosíssimas, de valor incalculável (depois que você se eleger a gente acerta!) que o ajudarão a penetrar no submundo das campanhas eleitorais colocando em prática o “Como enganar o cidadão e fazê-lo votar em você para presidente”, para tirar o máximo de proveito da “inocência” do pobre cidadão brasileiro. Isto será uma base pra você decolar nas pesquisas eleitorais e, com muito pouco esforço, ganhar as eleições para a Presidência da República.

Observação : A leitura deste manual é expressamente proibida àqueles raros políticos que ainda possuem caráter, moral e  dignidade.


LIÇÃO Nº 01

Para se tornar um bom político, você precisa ter berço. Desde pequeno, o futuro candidato já deveria demonstrar traços políticos no seu caráter. Por isso, logo ao nascer ele deveria ter o seguinte pensamento: “Um dia eu vou ser presidente do Brasil!”. Toda a sua vida deveria prepará-lo para alcançar este objetivo, custe o que custar. Existem quatro fatores importantíssimos que podem ser observados no decorrer desse tempo:

  • Fator social: para ser um futuro presidente da República, é indispensável nascer em berço de ouro e numa família já de tradição política. Sendo pobre e de família desconhecida, ninguém dará valor a você e o máximo que você irá conseguir é tornar-se líder sindical ou um vereador de terceira para sempre[2];
  • Fator educacional: uma boa educação é indispensável. Estudar em colégios e faculdades de renome, no Brasil e no exterior faz a diferença. Se você ainda não pensou nisso, comece a pensar agora para as eleições futuras. Forme-se em Sociologia, Filosofia, Direito, Comunicações, Letras e outros babados que lhe garantam a posição de “homem culto” dentro da sociedade;
  • Fator psicológico: seja um homem equilibrado emocionalmente; não perca a cabeça por pequenos problemas. Seja amável, afetuoso e tranqüilo;
  • Fator moral: seja moralista, intransigente, perfeccionista, religioso. Apoie veementemente a instituição familiar, os bons costumes e tudo aquilo que a sociedade considere como sendo politicamente correto. Ame sua Pátria!

Importante: No desenrolar de sua vida, você precisará levar tudo isso muito a sério, para que no futuro as pessoas lhe dêem total credibilidade e lhe chamem de santo. Assim será mais fácil enganá-las e ganhá-las para o seu lado. Se você não nasceu em berço de ouro, terá a vida inteira para “conquistar” um.


LIÇÃO Nº 02

Como todo futuro candidato à presidência da República, você deve cultivar desde cedo um forte sentimento político. Admire todos os políticos que foram bem sucedidos na história; tome-os como heróis e mire-se no exemplo deles. Ame o sistema capitalista e tenha como livro de cabeceira “O Capital” de Karl Marx. Na escola, em casa, no lazer ou no trabalho seja sempre um político. Já é um treinamento.

Importante: Na verdade, para ser um bom político não é necessário saber absolutamente nada sobre política. É por isso que foi inventada a “politicagem”.  A você basta um sorriso simpático e um belo discurso que impressione a massa. E se você for muito bonito, a eleição está no papo.


LIÇÃO Nº 03

Comece bem cedo a sua vida pública, participando de associações de moradores, sindicatos e outros mais. Seja revolucionário e radical, mas sempre assumindo uma certa postura intelectual. Procure mostrar para o cidadão o quanto você é bonzinho e se preocupa com os problemas sociais da nação.

Importante: Conquiste ao máximo as pessoas para o seu modo de pensar, fazendo-as achar que só você está certo. Lembre-se de que estes que convivem hoje com você podem ser os seus futuros eleitores.




LIÇÃO Nº 04

Praticamente tudo aquilo que foi semeado até hoje você começará a colher na sua primeira candidatura. Normalmente começa-se por baixo, isto é, vereador. As pessoas que conviveram com você durante todos estes anos, que viram você crescer na sua vida pública, que acompanharam a sua luta pelo bem da comunidade e, principalmente, que absorveram grande parte do seu modo de pensar (reveja lição anterior), são as mesmas pessoas que lhe colocarão no poder. Mas tome muito cuidado! Assim como você, existem pessoas que só agem por puro interesse. Você precisa identificar quem são os lobos e quem são as ovelhas.

Importante: O que importa mesmo é que, tanto um quanto o outro, vote em você. Aquele que se recusar a passar para o seu lado, você compra (veja lição 11 ).


LIÇÃO Nº 05

Durante o seu mandato de vereador procure impressionar. Defenda na câmara municipal projetos que beneficiem a sociedade. Use de psicologia! Depois disso você deverá assumir os seguintes cargos que servirão de trampolim para a sua vitória final: Prefeito, Governador, Deputado Estadual, Deputado Federal, Senador e Ministro da Fazenda. Com uma carga política dessas, você se tornará apto a governar com unhas de ferro um País chamado Brasil.

Importante: Como ministro da Fazenda você precisa inovar a política econômica do País. Sendo que o Brasil já passou por tantos planos econômicos, por que não inventar um novo? Estude a situação; mude o nome e a cara da moeda. Caso o seu plano dê certo e, aparentemente, a situação econômica do País melhore, as pessoas verão em você um jovem promissor e dirão: “Se ele fez tudo isso só como ministro, imagina se ele for eleito presidente!”. Provavelmente, então, começarão a requerer a sua candidatura.


LIÇÃO Nº 06

Todas as lições dadas até o presente momento serviram apenas como base para o futuro. E o futuro já chegou!  Você já passou por um longo período de experiência: de vereador a ministro da fazenda. O plano econômico foi um sucesso e a sua cotação está em alta. A mídia te assedia e você virou verdadeiramente um ídolo nacional. Hora de lançar a sua candidatura.

Importante: Certamente você tem acompanhado as últimas eleições e tem visto que partido de esquerda não faz presidente[3], porque não compram votos, não se aliam a partidos da bancada do governo, não negociam sua ética, seu caráter, sua dignidade e sua moral[4]. Portanto, se você quiser sair vencedor, filie-se a um partido de extrema-direita, que esteja em ligação direta com o atual governo, do qual você já é ministro.



LIÇÃO Nº 07

Todo candidato precisa de um perfil para si mesmo e para o seu governo. Em seu livro “Marketing Político e Governamental”, editado pela editora Summus, o autor Francisco Gaudêncio Torquato do Rego cita 15 “valores para a construção de um conceito de governo” (página 53). Estes valores devem permear a visão política do candidato para um bom desempenho de sua função. Mas, creio eu, a teoria é muito diferente da prática. Por isso, gostaria de sugerir aqui uma “teoria prática”, isto é, a realidade descascada, nua e crua, como a vemos na atual politicagem do País. Basta apenas você inverter os valores e terá o perfil completo de um político verdadeiramente brasileiro:

  • Indignidade, falta total de caráter, de moral e de ética;
  • Valorização da classe política que apóia as suas idéias, os seus projetos e a sua politicagem. Desprezo aos demais;
  • Desonestidade em todos os propósitos; mascaramento total, hipocrisia;
  • Desonra, desonestidade, isto é, improbidade total;
  • Governo de portas abertas para si mesmo e portas totalmente lacradas para o povo;
  • A procura da melhor solução para a sua situação financeira;
  • Compromisso consigo mesmo;
  • Descompromisso com a democracia, volta a ditadura – a sua;
  • Favoritismos políticos, sociais, étnicos, religiosos, etc.
  • Desumanidade nas decisões, intransigência, racionalidade, legalismo;
  • Dependência total nas negociações externas. O Brasil em 2º lugar. Venda-o aos poucos;
  • Mudanças sem nenhuma participação do povo; o povo deve ser o último a saber;
  • Soberba, orgulho, autoritarismo, prepotência;
  • Incompetência, falta de profissionalismo, displicência, indiferença;
  • Mordomias para você e sua família; viagens e lua-de-mel no exterior com dinheiro dos cofres públicos. Excesso administrativo.


LIÇÃO Nº 08

Começa a guerra! Durante algum tempo você terá de aparecer no horário político gratuito apenas puxando o próprio saco, mostrando suas obras em governos anteriores e dizendo-se ser a solução definitiva para os problemas mais conflitantes do País. Logo depois virá a campanha eleitoral propriamente dita, onde todos os candidatos serão conhecidos e você terá o prazer de dizer: “Votem em mim para a Presidência!”. Para convencer o povo de que você é o melhor, você precisará de um bom discurso e um bom plano de governo. Portanto:

  • Faça uma pesquisa a nível nacional para saber qual é a opinião do eleitor sobre a atual situação do País, e quais são as principais áreas em que o governo deverá atuar;
  • Certifique-se que seu plano econômico lhe rendeu um bom IBOPE e explore isso ao máximo em todas as suas declarações;
  • Não venha com papo furado: Fale aquilo que você sabe que o povo espera ouvir de você;
  • Evite o máximo tocar em questões polêmicas que envolvam uma grande discussão ética e moral; por exemplo: aborto, homossexualismo, pena de morte, entre outros. Isto sempre causa divisão e quem sairá perdendo (votos) é você. Caso seja questionado sobre estes assuntos, procure se manter neutro;  neste caso não seja partidarista, seja sábio (pra não dizer esperto),  defenda a moral sem condenar o amoral!


LIÇÃO Nº 09

Na sua campanha para Presidente, além de um bom plano de governo, você precisará seguramente de um ótimo marketing político. Bom, o produto que você quer vender é “você mesmo”, por isso você deve investir o máximo na sua própria imagem, realizando competentemente um excelente marketing pessoal, procurando levar o eleitor a pensar que você é a melhor pessoa do mundo. A embalagem do presente deve causar boa impressão, principalmente se o presente não for muito bom. Portanto:

  • Informe ao eleitor sobre a sua formação acadêmica; prove o quanto você é intelectual e faça-o perceber o que o País poderia lucrar com um presidente tão culto. Se você não for tão culto assim, precisará de um excelente assessor de marketing;
  • Projete em toda a mídia a sua imagem de bom pai de família, excelente marido, ótimo amigo, maravilhoso vizinho, um homem esplendoroso, muito bem intencionado, carismático, amável, companheiro fiel, lutador, religioso;
  • Resgate do passado toda a sua vida pública (reveja lição anterior). Mostre os seus maravilhosos feitos, seus trabalhos hercúleos desde um simples líder comunitário até um bem sucedido ministro da fazenda. Mostre na TV suas obras públicas nas áreas de saúde, educação, transporte, moradia, etc.
  • Se você for casado, não desgrude da sua esposa; demonstre-se bastante afetivo em público. Se tiver filhos, use a imagem deles na campanha, sorridentes, abraçando-o.

Importante: Provavelmente algum candidato rival, de esquerda, conseguirá  provar o contrário e até daquela maconha que você fumou na adolescência, daqueles milhões que sumiram dos cofres públicos quando você ainda era governador, daquela obra superfaturada para uma empresa da sua família ele via falar. Mas fique frio; procure manter a pose, o nível. Eleição é assim mesmo. Diga que é tudo mentira, que é intriga da oposição. Se a imprensa insistir no assunto, exclame: “Isso é uma pantomima! Isso é uma patuscada!”


LIÇÃO Nº 10

Existem ainda outras áreas importantíssimas que deverão ser trabalhadas durante a sua campanha eleitoral. Você precisa saber como agir, pois o cidadão é uma criança e quer pirulito. Veja como atuar nas seguintes áreas:

  • Cabos eleitorais: Procure jovens desocupados e cheios de vigor. Normalmente eles não têm ideologia, mas por uns trocados darão a vida pelo seu ideal. Dê preferência àqueles com jeitão de guerrilheiros ou terroristas. Confira a eles o poder de comprar todos os votos possíveis e negociar os impossíveis;
  • Comícios: É nos comícios onde se encontra o maior número de pessoas dispostas a ouvir você falar. Na verdade todos estão lá para ouvir as bandas que irão tocar[5]. Espalhe no meio do povo seus cabos eleitorais para agitar a galera e fazer a oposição pensar que todos estão do seu lado. Isso causa um grande efeito psicológico e dá IBOPE. Quando falar, diga aquilo que o povo espera ouvir (Reveja lição nº 8,c);
  • Corpo-a-corpo: Ande a vontade no meio do povão; distribua sorrisos, beije as crianças; visite orfanatos, asilos, penitenciárias, favelas, hospitais e qualquer outro lugar onde houver um eleitor em potencial. Acene com a mão; faça “paz e amor”. Vá às igrejas evangélicas, freqüente missas, conquiste os votos de todas as representações religiosas do país;
  • Debates na televisão: Exponha todo o seu plano de governo de forma simples e direta. Cuidado com o que você for falar, pois tudo aquilo que disser poderá ser usado contra você no horário eleitoral; seja esperto. Não entre em conflito com os outros candidatos e muito menos ataque-os verbalmente, isso pode denegrir em muito a sua imagem; preocupe-se apenas em fazer com que o eleitor compreenda que você é simplesmente “o melhor”.
  • Interior: Ao chegar numa cidade do interior, certifique-se dos problemas mais graves que estejam atingindo a comunidade e teça o seu discurso em cima disto.

Importante: Existem ainda outras áreas que você descobrirá com o tempo. Saiba também de quem ganhar votos. Exemplos: Evangélicos, aposentados, índios, comerciários, industriários, professores, funcionários públicos, etc.


 LIÇÃO Nº 11

Nem só de marketing pessoal e propaganda eleitoral vive um candidato a presidente. É necessário muito mais do que isso, para se enganar um cidadão e fazê-lo votar em você para presidente. Se mesmo com tanta campanha você vir que seu IPOPE está caindo, faça como a maioria dos políticos está acostumados a fazer:  COMPRE  O VOTO DO ELEITOR ! Lembre-se do que foi falado na introdução deste manual. É assim que se vence uma eleição no Brasil. Quem não tem condições de comprar votos ou simplesmente não quer abrir mão do seu caráter e da sua ética para fazer isso, dificilmente se elegerá a algum cargo público, principalmente o de presidente da República[6]. Este é “um País chamado Brasil!” Eis que lhe dou, então, preciosíssimas dicas de como comprar um voto sem suar a camisa:

  • É um fenômeno praticamente inexplicável à luz da razão, mas o cidadão eleitor se amarra em certos tipos de bugigangas, tais como: chaveirinho, boné, camiseta, etc. Por isso, faça como os colonizadores fizeram com os índios para conquistá-los: ofereça esse tipo de porcaria que, apesar de não ter valor algum, conquista a simpatia do povo. E, principalmente, o voto;
  • Em época de eleições é indispensável ter conhecimento das necessidades primárias de cada cidadão para tirar proveito disso e conquistar (pra não dizer comprar) de vez o voto alheio. Então, outros produtos indispensáveis na sua dispensa eleitoral são: tijolo, telha, cimento, dentadura e óculos. Está provado que a maioria dos eleitores que se aproximam espontaneamente de você para vender os seus votos, estão interessados em pelo menos uma dessas cinco coisas;
  • Existem, porém, outros cidadãos que, além de não apreciarem nem um pouco as suas bugigangas, não necessitam destes outros produtos.  Prometem votar em você e até trabalham de graça na sua campanha, mas uma coisa eles querem em troca: um bom cargo no serviço público. Ofereça, então, a mercadoria que eles procuram. É infalível!
  • Entretanto, também existem uns cidadãos que não ligam para bugigangas, não querem construir uma casa, não estão banguelas ou míopes e nem tampouco precisam de emprego. O que eles querem é dinheiro vivo. Dê! Dê muito e exija mais ainda em troca: o voto deles, dos parentes, dos amigos, etc.
  • Outro modo de comprar o voto do cidadão eleitor é transferindo o título dele para a cidade onde ele deverá votar. Mas como a eleição é para presidente e ele poderá votar em você de qualquer lugar do País, tire o título caso ele ainda não o tenha ou transfira mesmo, só para agradar;
  • No dia da eleição, contrate ônibus, kombis e bestas para pegar o eleitor na porta de casa e levá-lo até a sua zona eleitoral. Distribua as bugigangas através dos seus cabos eleitorais. Desse modo você conquistará o eleitor indeciso que sempre é um votante seu em potencial;
  • Apresente ao cidadão uma imagem falsa de si. Não apenas uma ideia de você como pessoa, mas de coisas que você realizou sem ter sido necessariamente você. Por exemplo: em conluio com um prefeito ou um governador de alguma cidade ou estado, aproveite aquelas obras públicas que sempre são realizadas apenas em época de campanha eleitoral, e espalhe para o povo que é você quem está realizando tal obra. Através de boatos bem firmados por seus cabos eleitorais, o povo passará a acreditar piamente nisso e a uma só voz dirá: “Esse candidato é o melhor! Se antes de ser eleito, ele já está fazendo tudo isso, imagina quando se eleger .”
  • Mas você, como um bom politiqueiro, deve saber que não é somente o voto do eleitor que precisa ser comprado numa eleição para presidente, mas o apoio dos outros candidatos rivais. Procure aquele que mais agride a você e a sua família, tradicional no poder. Faça-lhe a seguinte proposta: “Eu lhe dou dez mil, você desiste da sua candidatura e passa a me apoiar”. Se ele perguntar: “E a minha dignidade?” Você responde: “Eu cubro!” Ele vai dizer: “Quinze mil e não se fala mais nisso”. E você diz: “Negócio fechado!”.
                                                                                                   
Importante: Anote o número da identidade e do título de cada cidadão que prometer votar em você. Não tenho muita certeza do motivo disso, mas parece causar um sentimento de compromisso. E provavelmente você não deve ter dinheiro no Banco disponível para isso tudo. Use, portanto, o dinheiro dos cofres públicos. Conquiste o voto dos empresários oferecendo-lhes inúmeras compensações pós-eleições. Sugue algum dinheiro deles.


LIÇÃO Nº 12


Hoje é o grande dia das eleições. O horário eleitoral gratuito já foi cancelado, assim como os comícios e qualquer outro tipo de propaganda eleitoral. Resta apenas sentar e esperar os resultados para ver se todo esse trabalho renderá o seu devido fruto. Que nada! Existem milhões de eleitores indecisos perambulando pelas ruas. Você tem da casa do eleitor até a sessão onde ele vai votar para convencê-lo de que você é realmente o bom, o melhor. Portanto:

  • Faça boca de urna descaradamente. Espalhe seus jagunços, quero dizer, seus cabos eleitorais para emboscar os eleitores na beira do caminho e capturar o voto deles;
  • Use a tática da lição nº 11,F;
  • Fraudulente as urnas; atrapalhe a contagem de votos;
  • Compre os mesários para colocarem votos a mais nas urnas;
  • Em urnas eletrônicas, espalhe um tipo de vírus que permita ao programa depositar o voto somente em você;
  • Use a imaginação, que é o que os politiqueiros mais possuem.


LIÇÃO Nº 13

Depois de uma vida inteira de sucessos, totalmente dedicada à política. Depois de uma cansativa campanha eleitoral para a presidência da república. Depois de um dia inteiro de boca de urna e, finalmente, depois de poucos dias de contagem de votos (ou poucas horas caso seja urna eletrônica), você está prestes a colher o fruto do seu árduo trabalho. Você está à frente nas pesquisas e os números estão ao seu favor. A última urna é contada; o resultado será conhecido em poucos instantes. E o novo presidente da República Federativa do Brasil é... VOCÊ! Meus parabéns! Você armou e se deu bem. Nadou e não morreu na praia. Mas stop! Não deixe a adrenalina subir demais à sua cabeça. Relaxe e siga as seguintes instruções:

  • Após um súbito ataque de amnésia aguda causada pelo stress da emoção de ter sido eleito presidente da República, esqueça todas as suas promessas de campanha: Saúde, trabalho, educação, reforma agrária, salário mínimo... Hã?! O quê?! Comece inventando desculpas. A mais conhecida é: É impossível mudar em pouquíssimos anos o que já está ruim a mais de 500!;
  • As únicas promessas que poderão ser cumpridas, com restrições, são as de cargos públicos aos seus eleitores (os peixes!);
  • Empregue parentes em cargos de confiança. Aumente o capital de toda a sua família e garanta um futuro melhor para seus filhos e netos;
  • Viaje bastante alegando assuntos exteriores. Vá passar a lua-de-mel no exterior com o dinheiro do povo;
  • Manipule a imprensa, faça loby, invente um mensalão, compre os votos dos deputados e senadores para apoiar os seus projetos, invista em obras superfaturadas. As opções são ilimitadas. Você pode tudo, pois o povo lhe deu o poder!
  • Transforme a vida do cidadão num verdadeiro inferno!


LIÇÃO Nº 14

Caso, infelizmente, o cidadão eleitor tenha aprendido a votar direito e a não jogar mais o voto na privada, e, por causa disso, você venha a perder as eleições, você só tem uma coisa a fazer: aliar-se imediatamente ao candidato eleito, mesmo que este seja adversário seu no governo e você tenha esculachado ele durante a campanha eleitoral. São águas passadas. Você não pode sair perdendo! Comece a partir daí novamente a sua odisseia. Daqui a alguns anos terá novas eleições. Siga este mesmo roteiro; o importante é não desistir jamais! Você é brasileiro e não desiste nunca.

Observação: Esta é uma obra fictícia. Qualquer semelhança com pessoas ou fatos reais terá sido mera coincidência – a não ser que liguemos a TV para assistir ao noticiário. Aí vira verdade.

Só para finalizar: Espero que o leitor tenha compreendido o caráter irônico desse manual. Na verdade, isto não é algo a ser seguido, mas pretende ser um retrato crítico do que tem sido feito. Pelo pouco que observamos, todos fazendo sempre a mesma coisa e do mesmo jeito, parece que existe realmente uma manual para enganar o eleitor. Glória a Deus pelos bons políticos que não se enquadram neste manual.




[1] Algumas modificações necessárias foram feitas no texto original com o fim de corrigir alguns erros gramaticais e atualizá-lo, sem deformá-lo.
[2] Em 2002 o presidente Luis Inácio Lula da Silva quebrou esta regra.
[3] Lula quebrou mais esta regra.
[4] Esta regra também foi mudada com o mensalão... O mundo está mesmo em constante transformação.
[5] Atualmente a justiça eleitoral proíbe a contratação de bandas para os comícios. O público diminuiu bastante e fez aumentar a necessidade de criatividade dos candidatos e as suas estratégias.
[6] É claro que existem muitos políticos honestos que vencem uma eleição mantendo a sua dignidade. Mas não é destes que estamos falando. O importante é não generalizar.

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