O texto a seguir é parte do meu livro DESVENDANDO O SEGREDO DE MARIA, no capítulo que trata sobre a hermenêutica bíblica.
2.3.1.b Primeira regra: tomar as palavras em seu
sentido usual, comum
Quando o interprete se depara com um
texto bíblico, ele deve ter em mente que ele não foi escrito em sua língua, mas
em outros idiomas. Algumas palavras utilizadas pelos autores bíblicos tiveram
sentido para quem as escreveu o os seus leitores na época em que o texto fora
escrito. Assim, quando lemos qualquer palavra na Bíblia, precisamos entender o
sentido que ela carrega no texto e no contexto original em que foram escritas.
Conforme veremos mais adiante, uma mesma palavra pode ter sentidos variados,
dependendo do autor que a escreveu, da sua época, do contexto histórico e do
contexto de ideias que ele pretendia transmitir naquele momento.
Um erro corrente até mesmo nas
traduções da Bíblia é a escolha errada de palavras para substituir termos
bíblicos que no nosso contexto possuem um significado diferente. Por exemplo,
aquilo que hoje traduzimos como “coração”, no texto bíblico hebraico significa
as entranhas, literalmente as nossas tripas. Na nossa cultura porém, é do
coração que brotam as emoções, assim como os judeus faziam alusão às entranhas.
Mas o sentido é preservado. Embora existam textos escritos na mesma época das
escrituras que contenham as mesmas palavras, para compreendermos o sentido
daquilo que a Bíblia nos diz, é nela mesma que devemos nos basear. A palavra
“evangelho”, por exemplo, não é de origem cristã, mas era corrente na época em
que os textos bíblicos foram escritos e significam “boa-nova”. Mas para
sabermos que boa-nova é essa, devemos consultar as Escrituras.
O contrário disso é o que o
catolicismo romano emprega na interpretação da Bíblia, não fazendo caso da
exegese correta, interpretando os textos na tradição Alexandrina, isto é, de
maneira espiritualista, sem levar em conta o significado real das palavras no
texto original. Dessa forma, inúmeros são os textos reconhecidos pelos teólogos
católicos como marianos e que não fazem qualquer alusão à Maria, nem o
significado das palavras, nem o próprio contexto em que elas foram escritas
originalmente. Um claro exemplo é a dificuldade em interpretar os “irmãos de
Jesus” descritos em vários textos bíblicos (cf. Mateus 12:46; 13:55; João 7:5).
A grande maioria dos teólogos católicos, como Murad (2009), interpretam esses
“irmãos” como sendo primos de Jesus, filhos de uma outra Maria, que seria mãe
também de Tiago e José, citando Marcos 6:3 em comparação com 15:40 e 16:1.
Apesar dos esforços dos teólogos
católicos para comprovarem que os irmãos de Jesus citados na Bíblia eram primos
de Jesus, filhos desta outra Maria, a própria Bíblia se encarrega de nos
revelar a verdade. Vejamos:
·
Em Mateus 12:46 está claro que “sua mãe e seus irmãos”
eram de fato mãe a irmãos de Jesus. Ele tinha quatro irmãos, que são
mencionados pelo nome em Marcos 6:3.
·
Em Marcos 6:3 existe uma descrição direta dos irmãos
de Jesus pelos nomes (Tiago, José, Judas e Simão), além das suas irmãs que não
são nomeadas. Os seus ouvintes, impressionados pelas coisas que ouviam, e pelas
maravilhas que presenciaram, indagam sobre “o carpinteiro, filho de Maria”,
isto é, o próprio Jesus. Neste caso é necessário atentar também para a palavra
“filho”. Embora ela seja utilizada em quase todos os idiomas para se referir a
um parente próximo (filhos da uma mesma mãe), na Bíblia pode ser utilizada para
remontar a um parente remoto. Embora sendo neto de Saul, Mefibosete é chamado
de seu neto. Ló é chamado de filho de Abraão, embora fosse seu sobrinho. Isto é
um hebraísmo que explica como todos os israelitas eram chamados de “filhos de
Abraão” (João 8:39), ou como existem os “filhos da promessa” (Romanos 9:8),
“filhos da ira” (Efésios 2:3), “filhos da luz” (Efésios 5:8). No texto de Marcos
6:3, todavia, a referência a Jesus como “filho” de Maria está diretamente
ligada ao fato de ele ter outros “irmãos e irmãs”. Isto é, tais irmãos e irmãs
eram reconhecidamente “filhos” de Maria, assim como Jesus. Uma interpretação
diferente é meramente especulativa.
·
Em Marcos 15:40 está claro que a Maria, mãe de Tiago,
o menor, e de José não é a mãe de Jesus. O contexto deixa isso bastante claro.
O Tiago mencionado neste versículo era o filho de Alfeu e irmão mais velho do
apóstolo João (Marcos 1:19; 3:17), morto por ordem de Herodes Agripa I (Atos
12:2). De José não se tem conhecimento. Esta Maria é citada novamente no
versículo 47 e em 16:1.
·
Em João 2:12; 7:1-10; Atos 1:14; 1 Coríntios 9:5 e Gálatas
1:19 vemos uma clara referência aos irmãos de Jesus, que ainda não criam nele.
·
Em Colossenses 4:10 temos uma ocorrência da palavra
“primo”, onde Paulo refere-se a Marcos como primo de Barnabé. Paulo utiliza o
termo aneyioz para “primo”. Em
Gálatas 1:19, ao referir-se a Tiago como o irmão do Senhor, ele utiliza adelfon tou kuriou. Em Mateus
12:46, o termo utilizado para os irmãos de Jesus foi o mesmo empregado em
Gálatas. O mesmo ocorre nos outros textos onde o catolicismo romano insiste que
os “irmãos” (adelfoi) de Jesus, na verdade são seus “primos” (aneyioz). Comprovada está a verdade da Bíblia pela própria Bíblia.
Embora em diversas partes da bíblia a palavra irmão possa denotar um
carinho especial por alguém, o compatriotismo, irmandade na fé. Embora Murad
(2009) utilize-se de Gênesis 11:31 e 13:8 para mostrar como irmãos podem
significar parentes próximos e Gênesis 2:11 para explicar o termo “irmãos” no
sentido de compatriotas, e com isto dar base à teoria de que os irmãos de Jesus
descritos na Bíblia eram seus “primos”, filhos de uma outra Maria ou de um primeiro
casamento de José, o fato é que outras regras da hermenêutica ainda precisam
ser observadas. Então o que explica a confusão literária entre as palavras
“irmãos” e “primos” causada pelos teólogos católicos? Uma declaração de Murad
(p. 113, 114) desvenda-nos o mistério:
Embora consideremos
somente a Bíblia como Palavra de Deus, nós, católicos, também levamos em conta
a Tradição cristã, isto é, tudo aquilo que a Igreja, inspirada pelo Espírito,
foi selecionando e acumulando na sua experiência, e afirmando como decisivo na
sua identidade. Guardamos, com especial carinho, os documentos de homens e
mulheres que viveram e testemunharam a fé desde o início, como Clemente,
Justino, Irineu, Inácio de Antioquia, Perpétua e Felicidade, Cirilo de
Jerusalém e tantos outros. Eles são chamados os “pais e mães da Igreja”.
Quando os argumentos baseados na
Bíblia não são suficientes para comprovar suas doutrinas, os teólogos católicos
ficam a vontade em apelar para a Tradição, para os sermões, orações, hinos
litúrgicos, cartas e outros depoimentos desses “pais e mães da Igreja”, ainda
que eles não se sustentam na Verdade divinamente revelada por Deus, ainda que
dela difiram, ainda que a ela deturpem e mesmo que dela tenham que abrir mão.
Assim, tendo-se o cuidado para não tomar a palavra ao pé da letra, mas buscando
os modos próprios de expressão de cada idioma (Lund e Nelson), é necessário
buscar sempre o sentido literal dos termos. Alguns textos podem nos soar
estranhos, como Lucas 14:26 ou Mateus 10:37, mas o estudo do idioma e do
contexto sempre nos levarão a uma correta interpretação da Bíblia. Compare-se,
por exemplo, os diversos significados, em diversos textos e contextos
diferentes, das palavras “mundo” e “carne”; ou das palavras “salvação”, “confiança”,
“fé”. Ou mesmo de “obras” em dois contextos: a teologia paulina da justificação
pela fé e a epístola de Tiago, irmão de Jesus.
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