12. DISCIPULADO
O evangelismo não acaba após a conversão do pecador. O evangelista é um multiplicador do Reino de Deus. O seu objetivo não é estagnar, mas crescer, conduzir as pessoas em seu crescimento e conquistar novos discípulos para o Senhor. O termo “discípulo” (gr. mathetés, fem. mathetria) significa um aprendiz, um aluno. Após a morte e a ressurreição de Cristo, “discípulo” tomou uma conotação bem abrangente, passando a designar “seguidor”, “crente”; isto é: o “cristão”. Então, quando o Senhor ordena fazer discípulos (ou discipular, gr. matheteusate), ele está ordenando que seus discípulos ensinem aquilo que aprenderam dele (v. 20). Tal ensinamento é contínuo e não acabará jamais; o cristão estará sempre no processo de construção do seu conhecimento de Deus e da sua Palavra. Deus, através do seu Santo Espírito, dá poder e dons aos seus filhos para a grande obra do “Indo” de Jesus. O objetivo desses dons, de acordo com Efésios 4:11-16, é o aperfeiçoamento dos santos e o desempenho do seu serviço para a edificação do corpo de Cristo. Paulo escreveu a Timóteo: “E o que de minha parte ouviste, através de muitas testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para transmitir a outros” (2 Tm 2:2). Isto significa que Timóteo deveria se empenhar em fazer e treinar discípulos para que eles estivessem aptos a fazer e treinar novos discípulos, criando uma cadeia de discipulado constante. A orientação de Jesus aos seus discípulos é repetida por Paulo: “Ensinando-os” (Mt 28:20), “transmite... instruir a outros” (2 Tm 2:2). A educação faz parte da missão e do discipulado, envolvendo o caráter fiel e idôneo do discípulo-discipulador.
Uma Igreja que não discipula nem ensina os seus membros, abre as portas não somente para as heresias, mas para uma espiritualidade débil e uma fé infantil, frágil e infrutífera. Aqui se percebe claramente a atuação do Espírito Santo, porque é Ele quem ensina todas as coisas que o crente precisa saber (Jo 14:25,26). Se os crentes não são lembrados daquilo que a Bíblia ensina, estão fadados a esquecê-lo, o que afetará a sua fé, o seu caráter, o seu comportamento e o seu desempenho no Reino de Deus. O apóstolo Paulo constantemente exortava aos irmãos a respeito do seu progresso na fé, conforme já inteirados pelas instruções que receberam do Senhor Jesus (1 Ts 4:1,2). Logo, quando alguém é convertido e passa a frequentar a Igreja, todos os ministros precisam investir no acompanhamento desse novo discípulo de Jesus, fortalecendo a sua fé por meio da comunhão com os irmãos, da prática das boas obras e do aprendizado da Palavra de Deus.
O discipulado dos novos crentes envolve:
a) Integração. A integração é um momento de socialização, de inserção do novo convertido na vida da comunidade. É nesta etapa que ele conhece os valores da Igreja, suas políticas de relacionamento, seus deveres e seus direitos, as normas internas e aqueles que fazem parte da sua nova família. O novo convertido perde um pouco da sua individualidade para assumir o seu lugar no grupo, ajustando-se às suas novas responsabilidades, às convenções e aos padrões de comportamento comuns. É importante que a Igreja valorize este momento, porque é quando o novo crente precisará de maior acompanhamento para o desenvolvimento da sua nova fé. Muitas igrejas negligenciam a integração, recebendo novos membros e deixando-os soltos, sem fortalecê-los nem se importar com eles. A integração começa com o recebimento no novo convertido e passa pelos processos a seguir. Ela deve estar solidamente baseada na Bíblia, deve ser feita com amor e cuidado, atentando para a realidade espiritual de cada novo membro, auxiliando-o em suas dificuldades e necessidades, cooperando positivamente com o fortalecimento da sua fé. A escolha dos discípulos de Cristo é um excelente exemplo de integração. Os doze passaram por todo o processo: foram chamados, inseridos no grupo, ensinados e empoderados para cumprirem sua missão (Mt 10:5-15; Mc 6:7-13).
b) Desenvolvimento. O desenvolvimento se dá a partir do momento em que o pecador se converte. É Deus quem efetua esse crescimento através do processo de santificação (1 Co 6:11; Ef 1:4; Hb 12:14; 1 Pe 1:14-16; 1 Ts 4:3; Gl 5:19-25). Paulo orou pelos Colossenses, a fim de que eles vivessem “de modo digno do Senhor para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra, e crescendo no pleno conhecimento de Deus” (Cl 1:10). O desenvolvimento do cristão envolve: vida íntegra, prática de boas obras e crescimento constante por meio do aprendizado. Ao recomendar o cuidado contra a influência dos falsos crentes, Pedro exorta seus leitores: “antes, crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2 Pe 3:18). Aos crentes de Éfeso, Paulo escreve: “Mas, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é o cabeça, Cristo” (Ef 4:15). Esse processo de desenvolvimento contínuo do crente envolve a santificação, com o abandono de pecados (Tt 2:11-14). Aos filipenses, Paulo exorta a que desenvolvam a sua salvação com temor e tremor (Fp 2:12), sendo que esse desenvolvimento é operado por Deus (v. 13) e envolve a preservação da palavra da vida (v. 16). No auxílio ao desenvolvimento do crente, a Igreja o encaminhará na descoberta do seu lugar no corpo de Cristo, tanto pelo uso do dom espiritual quanto pela aplicação das suas habilidades naturais. Um curso para vocacionados é uma excelente ferramenta de desenvolvimento do cristão.
c) Acompanhamento. Acompanhar significa estar ao lado, observar, auxiliar. Durante três anos, o Senhor Jesus acompanhou o desenvolvimento dos seus discípulos, a quem ensinava e fortalecia. Ele não os escolheu e enviou sem o equipamento necessário e sem antes ensiná-los sobre o que deveriam ser e fazer. Antes de subir aos céus, prometeu o Consolador, que daria continuidade ao seu ensino (Mt 28:20). Todas as Igrejas devem ser ambientes de aprendizagem e crescimento, onde a estagnação espiritual, moral, intelectual, motivacional, relacional e organizacional sejam trocadas por treinamento, desenvolvimento, capacitação, avaliação e acompanhamento constantes, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos. Em primeira mão, esse ambiente deve ser proporcionado pelas lideranças, mas elas mesmas devem se entregar a tal processo, o que envolve, além da vontade e da disposição necessárias, tempo de oração, leitura da Palavra e prática do amor fraternal. É o amor que confirma e solidifica o corpo de Cristo (Ef 4:16; Fp 1:9) e motiva o seu trabalho e crescimento (1 Ts 1:3). A igreja deve viver no amor de Cristo, de modo que ele seja transbordante (1 Ts 3:12) e aumente a cada dia mais (2 Ts 1:3). O novo convertido precisa sentir-se valorizado e saber que é útil, que a Igreja se importa com o seu bem-estar e está disposta a investir nele, criando, assim, um servo valoroso para o Reino de Deus.
d) Ensino. Vemos como tudo aponta para o “conhecimento”, o que envolve a intelectualidade do ser humano. Até mesmo para amar é preciso saber o que é amar e como expressar este amor segundo a vontade de Deus. O ensino é a forma mais elementar e relevante de discipulado. (Mt 4:23; 9:35; 11:1; 28:20; Lc 20:1; At 5:42; 15:35; 1 Tm 4:12). O ensino doutrinário deve estar presente desde o início da vida cristã, onde o novo convertido adquire os conhecimentos bíblicos elementares e com o tempo passa a receber alimento mais sólido. O conteúdo deste ensino é o próprio Cristo (At 28:31). Desprezar a doutrina no exercício da fé é desprezar a própria fé, que está fundamentada na doutrina. A Palavra inspirada nos ensina, repreende, corrige, instrui, aperfeiçoa-nos e nos prepara para toda boa obra (2 Tm 3:16,17). É preciso lembrar o caminho certo a ser feito: da doutrina para a experiência, não o contrário. É a doutrina que fundamenta a nossa experiência com Deus, não o inverso. Se existem a Palavra e a doutrina, logo existe o seu ensino (1 Tm 4:13). Se não há ensino, a fé se dobra diante das heresias e da espiritualidade fraca e controversa (1 Tm 1:3,4; Gl 1:6-9). A doutrina é importante não somente para definir aquilo que cremos, mas também quem somos. Permanecer na doutrina de Cristo é crucial para revelar se estamos ou não em Deus (2 Jo 9). Se quisermos crentes fiéis e sadios, precisamos ensiná-los e discipulá-los constantemente.
A falta de estudo da Bíblia é uma demonstração clara de falta de amor para com o seu Autor. Como leite espiritual que a Palavra de Deus é e bússola para o cristão, ela precisa tornar-se o centro de nossas vidas. A partir do momento que deixamos de beber dela, deixamos de absorver seus ensinamentos necessários à nossa vida espiritual, deixamos de ter base para o evangelismo pessoal e perdemos a oportunidade de conhecer mais de Deus. O foco principal desta questão, assim como de todas as outras, é o amor. Sem amor a Deus e a sua Palavra, sem valorizar o aprendizado das Sagradas Escrituras como algo vital para a saúde do corpo de Cristo, torna-se difícil carregar a marca do Espírito, uma vez que se despreza a Palavra que Ele próprio inspirou e que o revela. Sem Bíblia, sem Igreja (Rm 10:8,17; Ef 6:17; 1 Ts 2:13; At 2:41; 17:11; Sl 1:1,2; 119:105; 109:11,97; Is 37:26; Cl 3:16; Ef 1:17; 6:17,18).
e) Consolidação. A consolidação é a confirmação da vocação cristã. O apóstolo Pedro escreveu: “Por isso, irmãos, procurai, com diligência cada vez maior, confirmar a vossa vocação e eleição; porquanto, procedendo assim, não tropeçareis em tempo algum” (2 Pe 1:10). Todo este processo de discipulado serve para fortalecer e confirmar a fé do novo convertido. Aqueles que jamais se converteram a Jesus de verdade, não demorarão a abandonar o Caminho, uma vez que percebam que existe uma variedade imensa de responsabilidades, onde o abandono de pecados, a preocupação com os outros, a necessidade de servir e a expectativa de sofrimentos e perseguições ajudam a separar o joio do trigo, os bodes das ovelhas. Quem se decidiu por Jesus por qualquer motivo que não seja o humilde arrependimento para a conversão gerado pelo Espírito Santo, com o intuito de abandonar a si mesmo para servir e adorar irrestritamente a Deus, não tarda a olhar para trás e voltar ao que era. Podemos estar certos de que aqueles eu foram enviados a Cristo pelo Pai jamais desistirão da fé, muito pelo contrário. O Senhor afirma: “eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6:44).
Neste capítulo seis do Evangelho segundo João, após o discurso de Jesus a respeito si mesmo como o pão da vida (vs. 45-59), muitos se escandalizaram e já não o seguiam mais (vs. 60,66). O Senhor, então, desvenda-nos uma verdade: é o Espírito quem vivifica, de modo que não pode permanecer no Senhor aquele que não possui o Espírito Santo, que não se identifica com Cristo por meio de uma fé genuína e do novo nascimento. Mesmo que aos nossos olhos todos sejam crentes, Jesus sabe os que verdadeiramente são. Ele afirmou: “Contudo há descrentes entre vós”, pois “Jesus sabia desde o princípio quais eram os que não criam e quem o havia de trair” (v. 64). Ele, então, repete: “Por causa disto é que vos tenho dito: Ninguém poderá vir a mim, se pelo Pai não lhe for concedido” (v. 65). Isso apenas confirma o que aprendemos a respeito da conversão. Nem todos os que seguem a Jesus foram trazidos por Deus; logo, não são convertidos e provavelmente alguns jamais serão. Por fim, a consolidação do discípulo de Jesus se dá pela prática da sua Palavra, pela santidade (Hb 12:14), oração (At 2:42) e a comunhão com os irmãos (Hb 10:24,25; Gl 5:13).
f) Encaminhamento. O encaminhamento neste processo inclui o fortalecimento da fé cristã por meio do discipulado em si e o despertamento para as vocações, onde o novo convertido é orientado a participar ativamente da obra de Deus, tanto na sua vida cotidiana quanto através de um ministério da Igreja. A Igreja pode agir como facilitadora dessa descoberta, promovendo cursos vocacionais e outras estratégias que auxiliem seus membros na busca por sua vocação. O ensino bíblico é o mais importante meio para este fim. Muitos crentes não se sentem a vontade para servir porque não sabem como nem onde, porque não foram instruídos sobre essa necessidade nem estimulados a tornarem-se obreiros produtivos. Embora a capacitação e o empoderamento principal partam da graça de Deus e da ação do Espírito Santo, a Igreja possui um papel educativo, que envolve o discipulado nessas questões. No encaminhamento o novo convertido toma conhecimento dos dons espirituais e da sua importância. Ele é estimulado a descobrir o(s) seu(s) dom(s) e a colocá-lo(s) em prática para auxiliar na edificação do corpo de Cristo.
g) Controle. O controle é o meio pelo qual a liderança da Igreja se assegura de que aquilo que está sendo ensinado tem sido praticado, se o novo convertido está se desenvolvendo positivamente e cumprindo o seu papel. A Bíblia está repleta de exemplos de controle, tanto da parte de Deus com relação aos homens, quanto da parte dos homens com relação à obra de Deus e aqueles que a realizam. O apóstolo Paulo, por exemplo, em todas as suas epístolas demonstra o seu cuidado com as igrejas que havia plantado, direcionando a vida espiritual, ministerial e prática dos irmãos, como, por exemplo, no caso da coleta aos santos pobres de Jerusalém (2 Co 8:10,11) e na avaliação do progresso das igrejas (At 15:36), o que se pode ver na apresentação das suas credenciais de apóstolo (1 Co 12:11-21). Também a Timóteo Paulo deu diversas ordens, no sentido de controlar de forma positiva o seu ministério (cf. 1 Tm 1:3,4; 3:4,5; 5:1; 6:9-11,13,14,17-21). Não devemos enxergar o controle como uma forma ditatorial de manter os crentes sob domínio do pastor e da denominação, mas como uma forma de avaliá-los, orientá-los, auxiliá-los na sua caminhada cristã e na identificação de falhas e avanços. A correção de Deus aos seus filhos, em Hebreus 12:5-7, é um claro exemplo da forma controlada como Deus opera na vida do cristão. A própria Escritura serve como controle da vida espiritual da Igreja (2 Tm 3:16,17). Moisés controlava de perto toda a obra da construção do tabernáculo (Êx 39:32-43). Por meio do profeta Samuel, Deus corrigiu a atitude de Saul, demonstrando total controle sobre a sua obra (1 Sm 15). Neemias também oferece um claro exemplo de controle (Ne 13:23-25). O controle é, para o líder, uma forma de responsabilidade e amor pela obra de Deus.
h) Multiplicação. A multiplicação ocorre quando o discípulo torna-se discipulador, como vimos na introdução deste capítulo. Quando isso acontece, significa que ele está aprendendo e amadurecendo na sua fé. Significa, também, que é um verdadeiro discípulo de Jesus. A Igreja deve incentivar e agir como facilitadora dessa multiplicação, oferecendo cursos, métodos, ferramentas e todo apoio necessário para que o crente possa servir a Deus com excelência.
Este estudo faz parte do livro CURSO DE FORMAÇÃO DE EVANGELISTAS, módulo 3: “Métodos evangelísticos”, do autor Mizael Xavier. Disponível em formato de livro digital no site ou no aplicativo da Amazon. Veja a capa:
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