sexta-feira, 25 de novembro de 2022

POR UMA GESTÃO COM PESSOAS

 



POR UMA GESTÃO COM PESSOAS

Mizael de Souza Xavier


INTRODUÇÃO


Há muitos anos o meio empresarial vem sofrendo mudanças profundas na área tecnológica e da informação, propiciadas em parte pela globalização e o avanço da Internet. Para se adequarem a este novo mercado e continuarem crescendo e atuando, as empresas tem buscado acompanhar essas mudanças, seguindo tendências e revendo seus valores, metas e objetivos. Tudo hoje muda rapidamente e somente quem caminha lado a lado com essas mudanças terá condições de se firmar no mercado e obter êxito.

Todavia, não é apenas o ambiente tecnológico e de informação que tem sofrido reconfigurações radicais nos últimos anos. Todas essas transformações e revoluções só foram possíveis a partir da transformação ocorrida no próprio ser humano. Não é a tecnologia que transforma o mundo, mas é o homem que o transforma com aquilo que cria e recria, e a tecnologia é apenas uma parcela dessa realidade. Existe uma visão limitada de que o homem precisa acompanhar as mudanças que ocorrem no mundo da tecnologia se desejar estar sempre atualizado e crescer. Em grande parte esse pensamento está equivocado, porque é o ser humano que tem evoluído e gerado as constantes mudanças. O mundo muda porque o ser humano está em constante evolução.

O quadro então se inverte: as novas tecnologias e o comportamento das organizações aparecem como consequências do mover do ser humano pela história, de modo que ambos é que precisam se adequar a ele. São as pessoas que criam as mudanças, que por sua vez precisam se adequar às pessoas, que criaram novas mudanças e tendências, transformando ainda mais o futuro. Há uma interdependência e uma interação entre o criador e a sua criação. Esta é uma realidade que precisa ser pensada e transportada para as organizações, acima de tudo como uma preocupação constante de quem trabalha diretamente com as pessoas.

A realidade de hoje é muito mais que adequar o trabalhador às necessidades da empresa, mas adequar esta às necessidades do trabalhador. Se uma organização aspira mudanças e inovações, é nos seus colaboradores que ela enxergará o principal fator para essas mudanças. Esse novo entendimento do homem como agente de mudanças, como ser que cria e transforma constantemente o ambiente em que vive, tem trazido um novo sentido à maneira como as organizações lidam com os seus colaboradores. Reconhecer que o ser humano está a frente da tecnologia e, na verdade, é quem a cria, muda a concepção de relação entre a empresa e seus funcionários. Esta mudança de paradigma é algo que influencia diretamente a Gestão de Pessoas.

Então, se o homem não é reagente, mas agente; se ele é quem propicia as evoluções tecnológicas como pensador e arquiteto da evolução; se parte dele as transformações que o mundo empresarial vem sofrendo, é necessário repensar a forma como as pessoas vêm sendo consideradas nas organizações, partindo desse pressuposto de que as organizações são as pessoas, pois máquinas não geram máquinas nem podem criar por si só uma nova realidade. Que tipo de gestão existe na empresa moderna? Será que ela se adéqua a esse novo ser humano? As teorias dos recursos humanos e da gestão de pessoas suprem essa demanda? Qual o real valor do capital humano para a empresa?

Ao enxergar no ser humano algo além de uma máquina de fazer coisas e percebê-lo como agente principal das transformações organizacionais, muito além das tecnologias modernas, pude questionar o papel dos gestores de recursos humanos e de pessoas e a forma como ambos abordam o tema. Percebi que ainda existe um logo caminho a percorrer até que os gestores aceitem a verdade de que as pessoas são tudo dentro de uma empresa. O capital humano e intelectual é o bem mais precioso que se pode obter, um bem que jamais será escasso enquanto houver investimentos em treinamento e capacitação, enquanto houver a crença de que as pessoas são inteligentes e possuem habilidades e competências diversas que podem e devem ser aprimoradas e aproveitadas em benefício de todos.

Surgiu dessa reflexão a necessidade de pensar uma gestão de pessoas que levasse em conta o ser humano como agente de transformação, como ser pensante, repleto de sonhos e desejos que o fazem diferente das máquinas que ele opera. Valorizar este ser humano e contribuir para o seu desenvolvimento pessoal e profissional é o maior investimento que um gestor pode fazer na sua empresa. Mas que gestor? Que tipo de gestão? Desenvolveu-se então a teoria da Gestão com pessoas.



DESENVOLVENDO A TEORIA


No início deste ano, comecei a cursar Gestão de Recursos Humanos, uma área bastante atraente e com grande potencial profissional no mercado de trabalho. Todavia, sempre que me vinha à mente ou ouvia em sala de aula o termo “recursos humanos”, algo me incomodava, porque eu não conseguia conceber o ser humano como apenas um recurso na empresa, mais um, além dos recursos financeiros e tecnológicos, ou mesmo recursos materiais e minerais. Que diferença haveria entre o aspecto humano e o material dentro do conceito de recursos? Isto me pareceu utilitarista demais, porque tomava o operário como algo a ser utilizado para os fins da empresa, algo que pode ser substituído e que não possui valor além da função que exerce em uma organização.

Foi quando deparei com o livro Gestão de Pessoas, de Idalberto Chiavenato, onde percebi uma visão nova da área, reconfigurada para atender às novas demandas organizacionais, onde o capital humano tem sido cada vez mais valorizado. Logo, comprei essa nova visão e essa nova nomenclatura: Gestão de Pessoas. Os humanos não eram apenas mais um dos recursos da empresa, mas passavam a ser vistos como sujeitos ativos e capazes, possuindo habilidades e competências a serem valorizadas e lapidadas pelo gestor. Segundo Chiavenato (2010, p. VII), “A Gestão de Pessoas tem sido responsável pela excelência das organizações bem-sucedidas e pelo aporte de capital intelectual que simboliza, mais do que tudo, a importância do fator humano em pela Era da Informação”. Esta é uma nova realidade para um novo tempo.

Entretanto, não demorou para que, em minhas divagações e leituras, eu começasse a repensar a própria terminologia “Gestão de Pessoas”. As minhas inquietações se tornaram ainda mais intensas quando iniciei um estudo aprofundado sobre a motivação humana no trabalho, onde aprendi o princípio mais básico da motivação: ninguém motiva ninguém, cada um motiva a si mesmo. Dessa verdade tão simples surgiu um questionamento inevitável: Se ninguém é capaz de motivar alguém, mas cada um é responsável por motivar-se, como pode alguém gerir alguém? Tal questionamento me remeteu ao pensamento do educador Paulo Freire, que eu já havia utilizado para falar a respeito de responsabilidade social e empreendedorismo social em um estudo anterior. Paulo Freire (1987, p. 68) escreveu: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”.

Entendi nessa declaração um sentido mais amplo para a Gestão de Pessoas: “ninguém gere ninguém, ninguém se gere sozinho, os homens se gerem entre si”. De um ser que é gerido, o colaborador passa a ser senhor da sua própria história e cooperador para a construção da história dos seus parceiros e dos próprios gestores. Ambos atuam conjuntamente para o desenvolvimento organizacional, respeitando suas funções, cargos e a hierarquia, mas de forma sinergística, de modo que não há mecanicismo nem utilitarismo, mas a completude entre todas as partes envolvidas na gestão. Entender esta questão, longe de ser apenas um debate, é algo crucial para repensar a forma como lidaremos com as pessoas na organização. A maneira como pensamos e tomamos o ser humano, com certeza influenciará no trato que temos com ele, no valor que lhe daremos. Objeto (utilitarismo) ou recurso (mecanicismo)?

Era necessário, então, aprofundar o tema e buscar uma nova compreensão na forma de tratar essa área tão importante nas organizações: aquela que trabalha diretamente com as pessoas. Pensando acerca do assunto e me aprofundando ainda mais nas teorias administrativas históricas, cheguei à seguinte terminologia: Gestão com Pessoas. Quando achava que havia descoberto algo novo e revolucionário, descobri que o tema já vem sendo alvo de debate entre os teóricos da moderna Administração. Isto é bastante positivo, por dois motivos: primeiro, já existem estudos e pessoas comprometidas em transformar a Gestão de Pessoas em algo ainda mais humano e eficaz para as organizações, integrando gestores e colaboradores, que passam a ser vistos como parceiros; segundo: as minhas inquietações realmente apontavam para o caminho certo e tinham fundamento científico.

Após descobrir a existência do termo “Gestão com Pessoas”, empreendi uma pesquisa para saber a opinião de outros pensadores a respeito do tema, o que me levou a descobrir que não diferem em nada daquilo que eu havia pensado. Um exemplo é o artigo “Gestão de Pessoas ou Gestão com Pessoas?”, escrito por Júlio César Vasconcelos para o site RH.com.br. Neste artigo bastante esclarecedor, o autor se utiliza das teorias gramaticais para avaliar qual o impacto desses dois conceitos nas organizações. Ao avaliar o termo “de pessoas”, Vasconcelos conclui que essa expressão, chamada de sintagma nominal, confere à gestão de pessoas uma função meramente restritiva, diferenciando Gestão de Pessoas de outros tipos de gestão, como de máquinas, equipamentos e até mesmo de animais. Assim como acontece com os recursos humanos, o trabalhador é colocado no mesmo nível das máquinas ou dos animais irracionais, utilizado de maneira passiva para atender às demandas da organização.

Com relação ao termo “Gestão com Pessoas”, as suas observações coadunam com as minhas conclusões. Como adjunto adnominal, conforme explicita Vasconcelos, esse termo traz uma significação bem mais apropriada para aquilo que queremos falar quando pensamos em gerir pessoas. Há uma cooperação entre todas as partes envolvidas na administração, de modo que todos se envolvem e participam, na de forma irracional e passiva, mas ativamente, integrando competências e habilidades para o bem comum, onde todos saem lucrando. Esse tipo de entendimento já é realidade em grandes organizações, que valorizam a criatividade e o desempenho dos seus colaboradores, fornecendo estruturas que facilitam o seu desenvolvimento na empresa, com incentivos que vão além do financeiro e produzem motivação e bem-estar individual e coletivo.

Novamente Chiavenato (idem, p. VII e VIII) também está na discussão e elucida um pouco mais os fatos:


Administrar com pessoas significa tocar a organização juntamente com os colaboradores e parceiros internos que mais entendem dela, dos seus negócios e do seu futuro. Uma nova visão das pessoas não mais como um recurso organizacional, um objeto servil ou mero sujeito passivo do processo, mas fundamentalmente como um sujeito ativo e provocador das decisões, empreendedor das ações, criador da inovação e agregador de valor dentro das organizações. Mais do que isso, um agente proativo dotado de visão própria e, sobretudo, de inteligência, a maior e mais avançada e sofisticada habilidade humana.

Um passo importante nessa nova concepção de gestão empresarial é o da compreensão do novo homem que compõe a sociedade. Para gerir com pessoas é necessário gerenciar os conflitos existentes entre as gerações. Há alguns anos, caberia uma visão mecanicista do trabalhador, onde cada operário era considerado apenas uma extensão da máquina que operava e todas as ações motivacionais das empresas estavam voltadas para o mero cumprimento de tarefas, onde as punições e humilhações eram partes integrantes do processo. Hoje, porém, com as a inovações tecnológicas e da informação, com a globalização e a ascensão da chamada “geração Y”, manter essa postura é impraticável e pode significar a derrocada da empresa.

O novo homem da nova sociedade tem pleno conhecimento de si e do seu valor como ser humano e profissional. Ele está apto a escolher entre diversas opções de empresas aquela que lhe oferece melhores salários e maior satisfação no trabalho. Ele sabe o que acontece em vários estados do seu país e em todas as partes do mundo, estando ligado às inovações do mercado, às revoluções científicas, filosóficas, econômicas e sociais que podem beneficiá-lo ou não. Dessa forma, não se limita mais ao pequeno espaço a sua volta, mas deseja expandir-se, transformar-se para acompanhar as constantes evoluções de um mundo que muda a cada minuto. Este novo homem jamais aceitará que seus talentos, suas competências, suas opiniões e suas decisões sejam renegados em benefício de alguma organização. Ele possui uma noção elevada do seu valor intrínseco.


SUBSÍDIOS PARA UMA GESTÃO COM PESSOAS


O primeiro elemento a ser explorado é a necessidade de uma mudança estrutural da mentalidade das organizações, que acompanhe de perto essa revolução e permita que essas inovações aconteçam. Gerir pessoas não é mais uma realidade aceitável, mas é preciso gerir com pessoas, tornando-as parte integrante da organização, amigas, parceiras e atoras dos processos organizacionais. É preciso repensar o papel do Gestor de Recursos Humanos e a sua metodologia. É importante que as teorias relacionadas à moderna Gestão de Pessoas sejam colocadas em prática e deixem de ser apenas belas teorias acadêmicas escritas em livros e manuais. Não há como negar o fato de que o trabalhador é quem dá a cara da empresa, que é ele quem empresta suas habilidades para que ela cresça e se solidifique. Mais do que recompensá-lo pelo seu bom desempenho, os gestores devem agregar valor a ele, tornando-o um verdadeiro cooperador.

Eis algumas ações que podem contribuir para a transformação da Gestão de Pessoas em uma moderna Gestão com Pessoas:


  • Criar ambientes de aprendizagem na empresa.

  • Manter uma visão holística das pessoas na organização.

  • Trabalhar as inteligências múltiplas (lógico-matemática, espacial, corporal-cinestética, musical, interpessoal, intrapessoal e naturalista).

  • Manter o foco nas competências na avaliação de desempenho.

  • Participação dos colaboradores nos lucros da empresa.

  • Incentivo à livre expressão do pensamento e estímulo à criatividade.

  • Participação ativa de todos nas tomadas de decisão.

  • Comunicação aberta e eficaz, eliminando ruídos e canais burocráticos.

  • Programas de incentivos salariais, como recompensas e remuneração diferenciada.

  • Investimento constante em treinamento e capacitação, inclusive com investimento na formação acadêmica dos colaboradores.

  • Atenção especial às necessidades individuais e pessoais dos colaboradores como fator de produtividade e motivação.

  • Cursos e programações sociais que envolvam a família dos colaboradores.

  • Descentralização do controle administrativo e diminuição dos níveis hierárquicos.

  • Líderes como facilitadores e não mais como gerentes.

  • Gestão afetiva, com a valorização dos aspectos emocionais dos indivíduos.

  • Identificação, aproveitamento e desenvolvimento do capital intelectual.

  • Promoção da motivação ascendente, descendente e horizontal.

  • Valorização, potencialização e otimização dos grupos informais.

  • Entendimento das pessoas como gestoras de si mesmas e co-gestoras da empresa.

  • Investimento em saúde e segurança no ambiente de trabalho, com ações que promovam o bem-estar físico, mental e social dos colaboradores.

  • Administração ética.

  • Fomentação do empreendedorismo.

  • Identificação e valorização dos diversos tipos de personalidades e temperamentos como fatores motivacionais e de crescimento organizacional, promovendo não somente a adequação desses fatores às demandas da empresa, mas a sua integração e interação.

  • Compreensão e estímulo da capacidade das pessoas de sonhar e reinventar-se sempre.


CONCLUSÃO


Concluo expressando uma ideia que, assim como a Gestão com Pessoas, não é nova, mas continua sendo revolucionária. Quando nos manifestamos com relação aos pontos anteriores, aos subsídios para uma moderna gestão que valorize as pessoas como tais e promovam o seu crescimento dentro da organização, não podemos nos ater apenas aos colaboradores. O envolvimento nessas competências e na forma como a gestão se encaminhará deve partir primeiramente dos empresários e gestores, envolvendo seus gerentes e líderes. Aqueles que estão no topo da pirâmide, se quiserem invertê-la para se adequar às novas demandas organizacionais, precisam também enfrentar o processo de aprendizagem e mudança.

Como enxergar no colaborador um ser humano sem enxergar-se humano? Como entregar a ele a autonomia de gerir a si próprio em interação com os demais membros da equipe sem antes conseguir fazer isto ser real na própria vida? Como enxergar talentos e limitações nos outros quando não se consegue fazer isso consigo mesmo? Quando falamos em inteligências múltiplas e gestão por competências, estamos nos referindo, também, aos gestores e seus encarregados. Todos os pontos abordados acima só serão possíveis quanto todos os níveis da pirâmide organizacional interagirem entre si, se tornarem humildes e abertos às mudanças necessárias. Entender-se como ser humano falho e limitado faz urgir mudanças, rompendo com aquilo que está estabelecido, mexendo com a nossa tranquilidade e comodismo para assumir riscos e participar do longo processo de aprendizado, do qual ninguém está isento de necessitar.



Questões para fomentar o debate


1. Qual o papel da liderança nessa nova compreensão de gestão?


2. Que ações o gestor de Recursos Humanos ou de Pessoas deve praticar para transformar seus funcionários em colaboradores e parceiros da empresa?


3. Quais são os principais pontos da moderna Gestão de Pessoas que podem contribuir para uma nova Gestão com pessoas?


4. Se o termo “gestor de Recursos Humanos” ou “gestor de Pessoas” não são convenientes à nova visão de “Gestão com Pessoas”, como se poderá designar aquele que trabalha com esse tipo de gestão?


5. O que as pessoas devem fazer na empresa para se gerirem entre si?


6. Que influência a Gestão com Pessoas exerce na comunicação organizacional, nas relações interpessoais e no trabalho em equipe e de que modo ela atua nesses três elementos?



Bibliografia


ARMSTRONG, Thomas. Inteligências múltiplas na sala de aula. 2. ed. Rio Grande do Sul: Artmed, 2001.


CHIAVENATO, Idalberto. Gestão de Pessoas. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.


FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 32. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.


ROSA, Sanny S. da. Construtivismo e mudança. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2007.


SACRISTÁN, José Gimeno. Educar por competências: O que há de novo? Rio Grande do Sul: Artmed, 2011.


Site: http://carreiras.empregos.com.br/comunidades/rh/fique_por_dentro/271008-rh_gestao_pessoas.shtm. Acessado em 11 de maio de 2012.


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