Ronaldo
está no trabalho; faltam poucos minutos para o término do seu expediente. Ele
espera ansioso por esse momento. O telefone toca. Do outro lado a voz carinhosa
de uma mulher. É a sua esposa.
-
Olá, meu amor! – cumprimenta ela.
-
Oi, minha vida – ele responde.
-
Tem alguém aqui que quer falar com você.
-
Oi, papai! – é seu filho do outro lado.
-
Olá! Como vai o meu garotão? – ele não pode ver, mas os olhinhos do seu filho
brilham ao falar com o pai pelo telefone.
-
Papai, você vem pra minha festinha?
-
Claro, meu filho. Assim que o papai sair do trabalho vai direto pra casa.
-
Você vai trazer o meu presente?
-
Já está dentro do carro, filhão.
Após alguns cumprimentos, os dois se
despem. Do outro lado, o filho de Ronaldo dá pulos de alegria. Ele o ama muito
e vê nele um grande amigo e um herói. Hoje é a festa de aniversário de 5 anos do
menino. Já está tudo pronto; em breve os convidados estarão chegando. Ele é
único filho do casal. A esposa de Ronaldo é uma mulher maravilhosa, uma mãe e
uma dona de casa dedicada. Eles dois se amam muito e se dão muito bem.
Chega, em fim, o horário de sair. Ronaldo
está ansioso. Sabe que seu filho o espera para a festa. Mas alguns colegas do
trabalho o convidam para ir até o bar na esquina tomar uma “gelada”, afinal, é
sexta-feira. Ele excita por alguns instantes.
-
Mas é rapidinho, não custa nada – insistem os amigos.
Então ele entra no carro com a turma do
escritório e vai tomar algumas geladas. Quando está no bar tomando a segunda
cerveja, o telefone toca.
-
Onde você está, meu amor? – é a sua esposa, um pouco já impaciente.
-
Calma, querida. Dei uma passada rapidinha no bar com meus colegas para tomar
uma e já estou indo para casa.
-
Se apresse. O pessoal já está chegando. Seu filho quer tirar foto com você.
Comprou o presente dele?
-
Sim. Não demoro, não se preocupe.
Antes de desligar o telefone, Ronaldo
ouve ao fundo a voz eufórica e ansiosa do seu filho perguntando à mãe: “Mamãe,
papai já está chegando?”. Mas ele decide que mais uma cerveja não vai demorar
tanto. E toma mais uma, e outra, e mais outra.
Depois de mais algumas garrafas,
Ronaldo olha para o relógio e decide que já é hora de participar da festa do
seu filho, algo tão importante para os dois. Ele está atrasado. Corre. Mas está
mais alegre, diferente; seus reflexos não são mais os mesmos; ele se sente
tonto. Um amigo se oferece para dirigir por ele, mas Ronaldo recusa; já está
acostumado a dirigir assim; é normal. Sua casa não fica tão distante, ora!
Entra no carro. Olha no banco do carona o grande pacote de presente. Liga o
carro. Sai rapidamente. Seus olhos pesam. No rádio toca uma canção: “De bar em
bar, de mesa em mesa, bebendo cachaça e tomando cerveja...”. É um forró
daqueles que ele gosta, que geralmente incentivam as pessoas a fazerem esse
tipo de coisa. E ele faz.
Enquanto Ronaldo tenta dirigir até a
sua casa, a festa já está rolando. Seu filho se diverte com os amiguinhos,
brinca e ri com o palhaço. Mas ele sente a falta do pai. A festa não é a mesma
sem o seu grande amigo, o seu herói. Ele pergunta constantemente a mãe: “Mamãe,
o papai já ta chegando?”. “Claro, meu filho” – responde ela já duvidando de si
mesma.
No carro, Ronaldo olha para o
relógio. Está bastante atrasado. Acelera mais um pouco. O carro parece passear
na pista. Ele faz uma ultrapassagem perigosa, derrapa, perde o controle. Tenta
manobrar o volante, mas está tonto, as toxinas do álcool minaram seus reflexos.
O carro invade o canteiro central da avenida; atropela um indigente que pedia
esmolas. Por fim, bate contra um poste, partindo-se ao meio, e Ronaldo é
arremessado violentamente para fora do veículo, já que havia se esquecido de
pôr o cinto de segurança. Seu corpo projeta-se velozmente contra o chão e seu
crânio é esmagado, enquanto o resto do seu corpo é feito em pedaços. O sangue
se espalha. Estilhaços de vidro batem contra a grande caixa com um lindo
presente dentro. O barulho das sirenes ecoam em poucos minutos.
O telefone toca na casa de Ronaldo
pouco tempo depois. A festa já está quase no fim. Seu filho já não brinca nem
ri tanto. Mas ao ouvir o som da campainha do telefone ele fica eufórico e
começa a gritar:
-
É o meu pai! É o meu pai!
A sua esposa atende.
-
É você, meu amor?– indaga ansiosa.
O semblante dela transforma-se. Os olhos se
enchem de lágrimas. Ela está paralisada. Alguém do outro lado acaba de lhe dar
a notícia do acidente e da morte trágica do marido. Ela está em estado de
choque. Seu filho puxa a barra do seu vestido. Ela olha para baixo,
estarrecida. Ele pergunta:
-
Mamãe, o papai já está chegando?
Com a voz sufocada na garganta, a única coisa
que ela consegue fazer é largar o telefone, abraçar-se ao seu filho e chorar.
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