terça-feira, 28 de julho de 2015

Mamãe, papai já está chegando?




Ronaldo está no trabalho; faltam poucos minutos para o término do seu expediente. Ele espera ansioso por esse momento. O telefone toca. Do outro lado a voz carinhosa de uma mulher. É a sua esposa.
- Olá, meu amor! – cumprimenta ela.
- Oi, minha vida – ele responde.
- Tem alguém aqui que quer falar com você.
- Oi, papai! – é seu filho do outro lado.
- Olá! Como vai o meu garotão? – ele não pode ver, mas os olhinhos do seu filho brilham ao falar com o pai pelo telefone.
- Papai, você vem pra minha festinha?
- Claro, meu filho. Assim que o papai sair do trabalho vai direto pra casa.
- Você vai trazer o meu presente?
- Já está dentro do carro, filhão.
            Após alguns cumprimentos, os dois se despem. Do outro lado, o filho de Ronaldo dá pulos de alegria. Ele o ama muito e vê nele um grande amigo e um herói. Hoje é a festa de aniversário de 5 anos do menino. Já está tudo pronto; em breve os convidados estarão chegando. Ele é único filho do casal. A esposa de Ronaldo é uma mulher maravilhosa, uma mãe e uma dona de casa dedicada. Eles dois se amam muito e se dão muito bem.
            Chega, em fim, o horário de sair. Ronaldo está ansioso. Sabe que seu filho o espera para a festa. Mas alguns colegas do trabalho o convidam para ir até o bar na esquina tomar uma “gelada”, afinal, é sexta-feira. Ele excita por alguns instantes.
- Mas é rapidinho, não custa nada – insistem os amigos.
Então ele entra no carro com a turma do escritório e vai tomar algumas geladas. Quando está no bar tomando a segunda cerveja, o telefone toca.
- Onde você está, meu amor? – é a sua esposa, um pouco já impaciente.
- Calma, querida. Dei uma passada rapidinha no bar com meus colegas para tomar uma e já estou indo para casa.
- Se apresse. O pessoal já está chegando. Seu filho quer tirar foto com você. Comprou o presente dele?
- Sim. Não demoro, não se preocupe.
            Antes de desligar o telefone, Ronaldo ouve ao fundo a voz eufórica e ansiosa do seu filho perguntando à mãe: “Mamãe, papai já está chegando?”. Mas ele decide que mais uma cerveja não vai demorar tanto. E toma mais uma, e outra, e mais outra.
            Depois de mais algumas garrafas, Ronaldo olha para o relógio e decide que já é hora de participar da festa do seu filho, algo tão importante para os dois. Ele está atrasado. Corre. Mas está mais alegre, diferente; seus reflexos não são mais os mesmos; ele se sente tonto. Um amigo se oferece para dirigir por ele, mas Ronaldo recusa; já está acostumado a dirigir assim; é normal. Sua casa não fica tão distante, ora! Entra no carro. Olha no banco do carona o grande pacote de presente. Liga o carro. Sai rapidamente. Seus olhos pesam. No rádio toca uma canção: “De bar em bar, de mesa em mesa, bebendo cachaça e tomando cerveja...”. É um forró daqueles que ele gosta, que geralmente incentivam as pessoas a fazerem esse tipo de coisa. E ele faz.
            Enquanto Ronaldo tenta dirigir até a sua casa, a festa já está rolando. Seu filho se diverte com os amiguinhos, brinca e ri com o palhaço. Mas ele sente a falta do pai. A festa não é a mesma sem o seu grande amigo, o seu herói. Ele pergunta constantemente a mãe: “Mamãe, o papai já ta chegando?”. “Claro, meu filho” – responde ela já duvidando de si mesma.
            No carro, Ronaldo olha para o relógio. Está bastante atrasado. Acelera mais um pouco. O carro parece passear na pista. Ele faz uma ultrapassagem perigosa, derrapa, perde o controle. Tenta manobrar o volante, mas está tonto, as toxinas do álcool minaram seus reflexos. O carro invade o canteiro central da avenida; atropela um indigente que pedia esmolas. Por fim, bate contra um poste, partindo-se ao meio, e Ronaldo é arremessado violentamente para fora do veículo, já que havia se esquecido de pôr o cinto de segurança. Seu corpo projeta-se velozmente contra o chão e seu crânio é esmagado, enquanto o resto do seu corpo é feito em pedaços. O sangue se espalha. Estilhaços de vidro batem contra a grande caixa com um lindo presente dentro. O barulho das sirenes ecoam em poucos minutos.
            O telefone toca na casa de Ronaldo pouco tempo depois. A festa já está quase no fim. Seu filho já não brinca nem ri tanto. Mas ao ouvir o som da campainha do telefone ele fica eufórico e começa a gritar:
- É o meu pai! É o meu pai!
A sua esposa atende.
- É você, meu amor?– indaga ansiosa.
O semblante dela transforma-se. Os olhos se enchem de lágrimas. Ela está paralisada. Alguém do outro lado acaba de lhe dar a notícia do acidente e da morte trágica do marido. Ela está em estado de choque. Seu filho puxa a barra do seu vestido. Ela olha para baixo, estarrecida. Ele pergunta:
- Mamãe, o papai já está chegando?
Com a voz sufocada na garganta, a única coisa que ela consegue fazer é largar o telefone, abraçar-se ao seu filho e chorar.

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