Uma das coisas que
as letras das canções evangélicas carece urgentemente é de apoio
escriturístico, isto é: conteúdo verdadeiramente bíblico. Muitas letras são
lindas, poéticas, causam emoção, arrancam lágrimas dos nossos olhos,
arrebatam-nos, mas o fundo não possuem nada de bíblico, muito pelo contrário,
dizem “verdades” que a Bíblia não ensina. Este problema atinge os dois lados da
história: aqueles que escrevem as letras dessas músicas e aqueles que ouvem sem
meditarem naquilo que está sendo cantado. Ambos parecem não se importar com o
conteúdo da mensagem que está sendo passada, não se dão ao trabalho de
consultar a Palavra de Deus para saber se as coisas de fato são assim (Atos 17:11,12).
Pode não parecer,
mas aquilo que cantamos possui grande repercussão na nossa vida e na nossa fé.
Se tomamos como Palavra de Deus o conteúdo dos hinos cantados nas igrejas e nos
shows de música gospel, corremos o risco de estar firmando a nossa vida e a
nossa fé sobre heresias. Agimos de acordo com o que ouvimos, tomamos como
profecia para nós, como revelação de Deus aquilo que cantamos. Como dizem
sempre: Deus fala conosco no louvor. Nos cultos, o louvor é considerado parte
da pregação, ao ponto de alguns dirigentes afirmarem que se o culto terminasse
ali, Deus já teria falado com a congregação. Em parte isto está certo, quando o
conteúdo dos nossos louvores não reflete a nossa má, imperfeita e desagradável
vontade, mas aquilo que Deus diz em sua Palavra, sem acrescentar um til ou um
i. Caso contrário, a Palavra não foi pregada e não houve edificação, mas apenas
destruição.
É preciso que a
Igreja do Senhor desperte para esta situação. Cantores e bandas evangélicas são
formadores de opinião. O público crente consome e propaga a mensagem que eles
desejam repassar, como acontece com propagandas, comerciais de TV, novelas,
filmes e telejornais. Nem sempre aquilo que é exposto é o correto, e é preciso
muito cuidado e sabedoria para selecionar o que vem de Deus e o que vem da
carne, ou mesmo do diabo. Os falsos profetas não sairão das religiões islâmicas
nem dentre os umbandistas, mas do meio do povo de Deus (Mateus 7:15-20; Romanos
16:17,18; 2 Pedro 2:1; 1 João 4:1). Não que todos os compositores sejam falsos
profetas, pode ser que sejam apenas servos do Senhor que não leem nem estudam a
Bíblia. É preciso haver discernimento. Em qualquer um dos casos, o nosso papel
é examinar as Escrituras, conhecer a Palavra de Deus para não ficarmos
papagaiando inverdades como se fossem revelações de Deus.
Um exemplo prático
está nos versos iniciais de uma canção bastante conhecida: Sabor de mel. A
cantora, Damares, inicia cantando: “O agir de Deus é lindo na vida de quem é
fiel”. Se isto é verdade, devemos concluir que na vida dos infiéis o agir de
Deus não é lindo. E mais: que para sermos abençoados por Deus e experimentar o
seu agir “lindo” na nossa vida devemos ser fiéis. Primeiro, claro que devemos
ser sempre fiéis a Deus. É isso que Ele espera de nós (Mateus 25:21; 1
Coríntios 4:2; Apocalipse 2:10). Analisando esse trecho da música sobre o agir
lindo de Deus na vida de quem é fiel, devemos nos perguntar: como é esse agir?
Ouvindo o restante da música, descobriremos que ele está ligado à bênçãos e
vitórias sobre a vida de alguém desacreditado pelo mundo, mas cuidado por Deus,
o que de fato acontece. Deus cuida de nós.
O sabor de mel
prometido pela cantora aos fiéis a Deus acontece após longa prova, onde o
escolhido não fica sem resposta, porque, mesmo clamando das cinzas, é atendido
por Deus, protegido, defendido. No fim, o crente sofredor estará no palco,
sendo ovacionado por aqueles que outrora o perseguiam e o desacreditavam. Eles
olharão e verão Jesus brilhando no fiel de Deus, que dirá alegremente: “Na
verdade a minha prova tinha um gosto amargo, mas minha vitória hoje tem sabor
de mel”. Ele pode cantar, louvar, agradecer a Deus por sua vitória, pelo
livramento, pelo sabor de mel acrescentado à sua vida pelo agir de Deus, graças
à sua fidelidade. Isto significa que a vitória que Deus nos promete está ligada
à solução dos nossos problemas, à nossa exaltação diante do mundo. Quando a
cantora afirma “Você é um escolhido, a sua história não acaba aqui; você pode
está chorando agora, mas amanhã você irá sorrir”, está apontando para uma
vitória terrena, envolvendo este mundo, onde o crente ganha a bênção que tanto
almeja. Isto é, a sua história continua naquilo que Deus lhe dará nesta vida,
nos bens perecíveis e roubáveis que ele deseja conquistar.
Fico imaginando a
vida de homens como Moisés que, embora tendo a promessa, não a alcançaram.
Moisés não entrou na terra prometida por Deus, pois fora desobediente. Então o
agir de Deus sobre ele não foi lindo? O agir de Deus não foi lindo sobre a
nação de Israel que peregrinou 40 anos no deserto e ficou prostrada ali mesmo
por conta de sua murmuração e desobediência? O agir de Deus não foi lindo na
vida de Saul e do rei Davi? Penso agora em Estêvão. Servo fiel do Senhor,
pregando a sua Palavra, proclamando as suas maravilhas e, de repente,
apedrejado até a morte. Então a vitória dele não teve sabor de mel? A plateia
não o estava aplaudindo, mas apedrejando. Então o agir de Deus não foi lindo na
vida dele porque ele sofreu e morreu no seu sofrimento? O que dizer do agir de
Deus na vida do apóstolo Paulo? Comissionado pelo próprio Senhor Jesus, dedicou
a sua vida a pregar o Reino de Deus. Sua vitória foi terrena, saborosa como o
mel? Por favor, leiam 2 Coríntios 11:16-33. Ele sofreu e foi martirizado, como
Pedro, que foi crucificado de cabeça para baixo por não se achar digno se
morrer da mesma maneira que Jesus.
E o que dizer dos
heróis da fé descritos no capítulo onze da epístola aos Hebreus. O v. 37 nos
diz que alguns foram escarnecidos, açoitados, aprisionados, apedrejados,
provados, serrados ao meio, mortos a fio da espada,degradados, afligidos,
maltratados. E os vs. 39 e 40 afirmam: “Ora, todos estes que obtiveram bom
testemunho por sua fé [com certeza eram fiéis!], não obtiveram, contudo, a
concretização da promessa, por haver Deus provido coisa superior a nosso
respeito, para que eles, sem nós, não fossem aperfeiçoados”. Então o que eles
conquistaram se passaram por todas essas provas e por fim morreram sem ter
alcançado a concretização da promessa? A resposta está no v. 16: “Mas agora
aspiram a uma pátria superior, isto é, celestial. Por isso, Deus não se
envergonha deles, de ser chamado o seu Deus, porquanto lhes preparou uma
cidade”. Deus estava com eles, era o Deus deles, agia na vida deles, tinha
promessas para eles. Eles, no entanto, além de não serem aplaudidos, sofreram e
não obtiveram as bênçãos terrenas que tanto anelamos, mas celestiais.
A vitória que vence
o mundo é a nossa fé (1 João 5:4,5). Quem é de Deus vence o mundo não somente
no tocante ao pecado, mas aos prazeres e conquistas limitados do mundo, que nos
tiram do verdadeiro foco: a nossa pátria celestial (1 João 2:15; Gálatas 6:14;
Tiago 4:4). Nosso anseio, nosso sonho, nosso desejo, nossa meta, nossos planos,
nossa vitória não devem estar nas coisas efêmeras desta vida, embora Deus se
alegre em no-los dar graciosamente. O nosso alvo maior, a nossa vitória
soberana está na pátria nos céus (Filipenses 3:20). Podemos não ter vitórias
terrenas no tocante à bênçãos materiais e conquista das nossas metas pessoais,
mas se estamos em Cristo, esperamos a sua vinda, a sua glória, a nossa
ressurreição para a vida eterna ao lado do Pai. Para o cristão verdadeiro,
estar passando pela prova já é a vitória, estar sofrendo por amor a Cristo já é
a vitória, estar privado de tudo, mas com Deus no comando já é a vitória
(Mateus 5:11,12; 1 Pedro 4:12-19; 5:6-11). A casa nova, o carro importado, a
viagem dos sonhos, a empresa de sucesso podem não vir nunca, mas o Senhor virá
em glória para lhe buscar. As pessoas podem não nos aplaudir no final, mas o
Senhor se alegrará e receberá a nossa alma.
Outra forma de
pensarmos a música de Damaris, do sabor de mel na vida daquele que é fiel, é
nos perguntando: Então quer dizer que quando Deus manifesta o seu agir na vida
do infiel, o seu agir não está sendo lindo? Não estou falando do fato de Deus
fazer chover sobre justos e injustos (Mateus 4:45), embora também poderíamos
seguir por esse caminho. Mas quando Deus pesa o seu braço sobre o infiel, ele
está agindo de forma linda, porque o agir de Deus é perfeito, não é lindo numa
situação e feio na outra. Se Deus condena o pecador ao inferno, seu agir é
lindo. O agir de Deus foi lindo na vida de Caim, de Faraó, de Herodes, Judas
Iscaiotes, de Ananias e Safira. O agir de Deus é lindo na vida de Satanás. A
justiça de Deus se manifesta perfeita em todas as circunstâncias (Salmo 9:8;
33:5; 119:142; Jeremias 9:23,24; Romanos 3:1-8). O agir de Deus será lindo na
vida daqueles que experimentarão a segunda morte, porque a vontade soberana de
Deus foi feita, porque o seu Santo Nome foi glorificado. O agir de Deus é lindo
na vida de quem é infiel também!
Músicas como esta
de Damaris apenas demonstram a cara do cristianismo antropocêntrico que tem invadido
as igrejas cristãs, com uma pregação triunfalista que insiste que “as bênçãos
do Senhor não acrescentam dores” e que o cristão vai “comer o melhor dessa
terra”. Lendo Hebreus 11, não podemos deixar de reparar as dores que aqueles
que foram fiéis a Deus tiveram de enfrentar. Olhando para a vida de João
Batista, do apóstolo Paulo, de Estêvão não consigo deixar de reparar as dores
que eles sofreram estando debaixo da soberana vontade de Deus, fazendo a sua
obra, pregando a sua Palavra. A sua dor e a sua pobreza contrasta com esse
evangelho triunfalista e falso pregado nas igrejas atualmente, evangelho que
retira o homem do centro da vontade de Deus e submete o Todo-Poderoso, criador
dos céus e da terra àquilo que as suas criaturas pecadoras determinam,
decretam, profetizam e exigem como seus supostos direitos. Os verdadeiros discípulos de Jesus
não comem o melhor desta terra, mas anelam pela volta do Salvador para levá-los
à sua verdadeira pátria. Deus todos os dias nos abençoa, derrama chuva sobre
nós, nos dá o que comer e vestir. Deus cuida dos seus filhos e das suas
criaturas tão amadas. Após a noite em lágrimas, vem o amanhecer de júbilo. Deus
nos guarda, protege, enriquece com suas muitas misericórdias. Mas ele não nos
dá o paraíso terrestre que os pastores, bispos e apóstolos da prosperidade nos
prometem.
A nossa fidelidade
a Deus não é uma questão de recebimento de bênçãos, mas da nossa nova natureza
como seus filhos, como regenerados, como novas criaturas. Não somos fiéis
porque esperamos receber algo de Deus, mas porque Ele nos amou, salvou e selou
com o seu Santo Espírito da promessa. A nossa fidelidade não dura até a
concretização da “bênção”, mas até a morte (Apocalipse 2:10,11). Não somos fiéis
por interesse, mas por amor. E se de repente deixarmos de ser fiéis, Deus nos
amaldiçoará, Ele virará as costas para nós e não mais mandará “o anjo trazer a
bênção”? De forma alguma. Como escreveu Paulo à Timóteo: “se somos infiéis, ele
permanece fiel, pois de maneira nenhuma pode negar-se a si mesmo” (2 Timóteo
2:13). Deus não permanece fiel a nós na nossa infidelidade, mas a Ele mesmo, ao
seu caráter e à sua Palavra. Ele continua executando a sua soberana vontade
sobre a nossa vida, completando a obra que em nós começou, cumprindo as suas
promessas eternas, porque a nossa infidelidade não apagará jamais o seu mover. O
seu agir continuará lindo, mesmo quando nos disciplinar por causa da nossa
infidelidade e desobediência (Hebreus 12:4-8).
Tais verdades
apenas reforçam a necessidade de conhecermos a Palavra de Deus, principalmente
quando desejamos falar dela para as pessoas, seja por meio da pregação ou do
louvor. Os hinos que geralmente cantamos são lindos, massageiam nosso ego,
exaltam a nossa carência de bênçãos, mas nem sempre são compatíveis com a
Revelação. O estudo que realizei rapidamente aqui, revela que não podemos
aceitar aquilo que nos dizem sem comparar com o que está escrito na Bíblia, por
mais espiritual e belo que nos pareça. A palavra final é a da Bíblia. Não podemos
ficar com apenas um pedaço da verdade – o pedaço que mais nos importa – mas devemos
ficar com a verdade inteira, mesmo que em alguns momentos ela vá totalmente
contra aquilo que pedimos ou pensamos. Esta é uma exortação aos líderes das
igrejas, para que não permitam que heresias se infiltrem sorrateiramente entre
os crentes. Vamos prezar pela Bíblia. Ela é a nossa regra de fé e prática, e não
o quê os cantores pregam em suas músicas.
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